VIAGEM PELA AMÉRICA DO SUL EM 1967
12ª PARTE
LIMA LA MAGNÍFICA,
LA CIUDAD DE LOS REYES
por Francisco Souto Neto
Esta é uma
transcrição do meu diário da viagem que fiz a vários países da América do Sul
em 1967, iniciada na semana em que completei 24 anos de idade. Passados 55
anos, é interessante observar os detalhes de como eram feitas as viagens
naquele tempo e as impressões que os lugares causaram a este então jovem
viajante. A transcrição do meu diário de viagem vai entre aspas, e quando eu
achar necessário intervir no texto, farei isto entre colchetes.
LIMA, CIUDAD DE LOS REYES
“Cheguei a Lima proveniente de Cusco.
Fiz a viagem a bordo de um ‘prop jet’ da LANSA. Ao início do voo, o avião,
pequeno, parecia roncar furiosamente para conseguir ultrapassar as altíssimas
montanhas da Cordilheira dos Andes, dando pinotes, corcoveando como um cavalo chucro
ainda não domado. Mas depois o avião estabilizou e cheguei muito bem ao moderno
aeroporto da capital do Peru.
Fiquei impressionado com a beleza da
cidade! Lima, 'La Magnífica', foi a capital da América do Sul quando a Espanha
era a senhora do mundo. E como fosse a 'cidade dos reis', capital de um
continente, justifica-se a construção de riquíssimas igrejas, paços monumentais
e belíssimas residências quando a cidade tinha apenas 100 mil habitantes. O
Palácio do Governo é esplêndido. O presidente da República chama-se Fernando
Belaúnde Terry.
Visitei a Universidade de San Marcos, infelizmente
semi-destruída pelo recente terremoto deste mesmo ano 1967, mas que já se
encontra em início de restauração. Essa foi a primeira universidade das
Américas, fundada um século antes de Harvard.
MEU ENCONTRO
COM PIZARRO
E UMA
INCRÍVEL CASUALIDADE!
Como de hábito, quando chego a uma cidade pela
primeira vez, costumo prioritariamente conhecer as principais igrejas, não por 'religiosidade',
porque não tenho religião alguma, mas para apreciar a arte sacra... e que
melhor lugar do que uma catedral para iniciar as visitações a uma importante
capital?
No caso de Lima, eu tinha lido, quando ainda fazia
pesquisas no Brasil antes da viagem, que a sua Catedral abriga a múmia de
Francisco Pizarro, guardada dentro de uma urna de cristal, sobre a qual há uma
estátua de bronze de um leão adormecido.
Fui diretamente à Catedral, um dos mais belos
edifícios de Lima pela arquitetura e riqueza do interior, que fica colada ao
igualmente suntuoso Palácio Arquiepiscopal. Fundada em 1535 pelo próprio
Pizarro, tem resistido a incêndios e terremotos. O altar-mor é todo de prata
polida e trabalhada. Fui procurando pela tal urna... e à direita de quem entra,
logo vi onde está a múmia daquele que mandou edificar a Catedral: Francisco Pizarro,
o Conquistador, dentro do caixão de cristal, sobre o qual dormita o leão de
bronze. É u’a múmia muito impressionante, ressequida, porém a desafiar os
séculos. O rosto já está descarnado, mas as mãos e os pés encontram-se intactos,
embora ressessos. Não foi sem emoção que meus olhos perscrutaram os restos
mortais agora marrons daquele que, cruelmente, conquistou o maior império do
mundo de então.
Ao meu lado, um grupo de turistas conversava. Subitamente
tive a impressão de que alguém chamava por mim:
– Francisco!
Claro que não era comigo que falavam, pois eu
estava só, na capital de um país estranho, onde ninguém poderia reconhecer-me. Continuei
examinando com interesse a múmia do Conquistador, quando ouvi perplexo:
– Francisco Souto Neto! – repetiram duas vozes com
sotaque, em coro.
Girei sobre os calcanhares: ao meu lado estavam
Ronald Lehman e Susan que sorriam, sorriam... Eram os meus amigos que viajaram
comigo no mesmo avião de Santa Cruz de La Sierra a La Paz, depois do trem de La
Paz a Guaqui, atravessamos o Titicaca no mesmo navio, e depois viajamos no
mesmo trem de Puno a Cusco. Casualmente encontrei-os em Machu Picchu, onde
ficamos juntos muito tempo visitando os sítios históricos da ‘Cidade Sagrada
dos Incas’. E depois, mais uma coincidência: encontrei-os no aeroporto de
Cusco, mas embarcamos para Lima em aviões e horários diferentes. E agora...
parece incrível, mas encontramo-nos mais uma vez casualmente, desta feita ao
lado da múmia de Pizarro. Nunca mais duvidarei disto: o mundo é de fato muito
pequeno. Trocamos impressões sobre a espantosa múmia de Pizarro. E mais uma vez
nos despedimos, entretanto agora para nunca mais nos vermos pessoalmente".
PORÉM A MÚMIA DE PIZARRO ERA... UMA FARSA!
[Tal
como já comentei anteriormente, eu viajava com uma máquina fotográfica
muito simples, não dotada de flash. Sem o recurso de flash, não adiantava
fotografar em locais sem luz natural, muito menos no interior sempre escuro de
igrejas. Então não fotografei a múmia de Pizarro.
Mas neste ano de 2022 em que estou fazendo a
transcrição da viagem realizada há 55 anos, resolvi procurar na internet por
fotografias do interior da Catedral de Lima, para ilustrar este meu artigo.
Encontrei no Google várias fotos do local da múmia de Pizarro, que fica acima
de alguns degraus, onde se encontra a urna de cristal com a figura de bronze de
um imenso leão dormitando. Mas através do cristal não se vê mais a múmia.
Parece haver um caixão comum no interior da urna que permanece com as paredes
transparentes, isto é, de vidro. Pensei que por algum motivo resolveram não
mais deixar à mostra a múmia de Pizarro. Eis como o Google mostra aquele lugar
atualmente, mas sem fazer referências a Pizarro:
Fiz mais pesquisas na internet e não encontrava nem uma única referência ao cadáver do Conquistador! Até que encontrei umas raríssimas fotos que mostram, embora de longe, a múmia dentro da urna de cristal.
Que mistério! Aprofundei minhas pesquisas agora em
espanhol, até que descobri o seguinte: aquela múmia que durante séculos lá
esteve, e que eu vi, não pertencia a Pizarro. Descobriram que se tratgava de um
cadáver qualquer. Uma farsa! Abaixo, o endereço de um estudo que provou que aquele
não era o cadáver de Francisco Pizarro. Vale a pena clicar no link abaixo, para
ver as fotografias:
http://www.franciscopizarro.info/www.franciscopizarro.info/La_Falsa_Momia.html
Embora decepcionado, devo dizer que felizmente
existe a reportagem acima, para explicar a realidade da história da falsa
múmia. E voltemos agora ao ano de 1967.]
MAS LIMA É ESPETACULAR
"Lima é uma cidade seca, onde nunca chove. A capital
do Peru encontra-se em uma das zonas com climas mais atípicos do mundo. Se 'chove' é uma garoinha super fina. Segundo os especialistas da área, isso
ocorre porque a capital peruana está entre a costa do
Pacífico e a Cordilheira dos Andes. Desta forma, não há condições
para a formação daquelas nuvens escuras, carregadas de chuva. Parece-me
que nas ruas não há esgotos para águas pluviais, porque estas não existem ou
são raríssimas [Antes da viagem li que em Lima os carros são vendidos sem
limpador de parabrisa, mas não me lembrei de observar se isso é realidade].
Isto, entretanto, não impede que Lima seja uma metrópole espetacular].
Estive em La Merced, e andei pelas ruas centrais
para sentir o clima cosmopolita de Lima.
EL CALLÁO
E O OCEANO PACÍFICO
Fui a El Calláo, cidade vizinha a Lima, por um
único motivo: queria ver e tocar o Oceano Pacífico. Até ali eu conhecia apenas
o Atlântico. O Pacífico era o segundo Oceano de minha vida.
Muito entusiasmado com o país e sua capital, no dia
seguinte eu faria uma viagem a outro sítio arqueológico do Peru, Pachacamac, ao sul de
Lima, onde se encontra la casa de las Mamacunas.
-o-
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