quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

A REVOLTA DA VACINA DE 1904 e A PANDEMIA NO BRASIL DE 2020 por Francisco Souto Neto em 31.12.2020.

Em meados de dezembro de 2020, Curitiba em situação gravíssima com o aumento de contaminações pela covid-19

 

Comendador Francisco Souto Neto 

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A REVOLTA DA VACINA DE 1904

e

A PANDEMIA NO BRASIL DE 2020

 

Francisco Souto Neto

 

Enquanto neste fim de 2020 dezenas de países, alguns muito menos importantes que o Brasil, estão vacinando suas populações contra a pandemia, nós continuamos sem definição de uma data para o início da vacinação em nosso país, com contaminações e mortes diárias crescendo verticalmente e atingindo níveis gravíssimos. Todos os Estados brasileiros estão com a lotação de seus hospitais chegando a um temível colapso, o que implicará em falta de leitos para tratamento de pacientes infectados pela covid-19. 

Estamos cientes de que, além de tudo, um dos problemas encontrados pelo governo para iniciar a vacinação em massa, além de ainda não existirem vacinas disponíveis, é a dificuldade para a compra de insumos, isto é, de seringas para aplicação das referidas vacinas, o que ocorre por negligência e falta de planejamento por parte do governo federal.  Enquanto isso, a escalada de contágio e de óbitos parece significar para o presidente da República apenas números sem muita importância.

Presidente Jair Bolsonaro.

 Como não bastasse, a parte da população que é mal informada, acredita no absurdo de que a vacina chinesa – que já está imunizando populações de vários países – é perigosa, que pode alterar o genoma humano, que carrega microchips e contém até vírus da aids com o propósito de prejudicar a saúde de quem for por ela inoculado.


A Revolta da Vacina de 1904



O estranho estado de coisas que se verifica em todo o país em relação à pandemia, fez-me lembrar de um capítulo da História do Brasil, que desde o tempo dos bancos escolares é conhecido de todos nós – ou pelo menos das pessoas mais bem educadas – com o título de “Revolta da Vacina”, que ocorreu em 1904.

Há 116 anos o Rio de Janeiro, capital do Brasil, era uma cidade com um deficiente, para não dizer quase inexistente, sistema de saneamento básico. Epidemias de varíola, febre amarela e peste bubônica eram frequentes e causavam grande mortalidade na população. O presidente Rodrigues Alves resolveu então implantar um sistema de reurbanização associado a inovador programa de saneamento básico, e designou o médico Oswaldo Cruz para organizar o combate às epidemias.



Foi aprovada a lei que tornou a vacina obrigatória. Teve que ser assim, porque a maciça maioria do povo desconhecia os benefícios que uma vacina traria para todos, e porque ouviram comentários de que a vacina consistia no líquido tirado das pústulas de vacas doentes, e todos ficaram temerosos de serem inoculados com tal líquido. Ainda pior eram os ridículos boatos de que homens e mulheres teriam que ficar nus para receber a vacina que seria aplicada em suas “partes íntimas”. E o populacho sem entender o que de fato representava a vacina, revoltou-se por acreditar que esta, além de humilhante, era ineficaz e perigosa.



Teve início uma grande revolta popular contra a vacina, que ocorreu entre 10 e 16 de novembro de 1904. O jornal Gazeta de Notícias registrou para a posteridade em sua edição de 14 de novembro de 1904: “Houve de tudo ontem. Tiros, gritos, vaias, interrupção de trânsito, estabelecimentos e casas de espetáculos fechadas, bondes assaltados e bondes queimados, lampiões quebrados à pedrada, árvores derrubadas, edifícios públicos e particulares deteriorados”. O governo chegou a declarar estado de sítio porque a revolta estava se transformando numa revolução. A muito custo a rebelião foi contida, porém resultou em 50 mortos e mais de 100 feridos. Houve centenas de prisões e de deportações de prisioneiros para os confins do Acre.




Sempre acreditei que esse grande incidente tenha acontecido porque o povo, há mais de um século, era desinformado, e que algo semelhante jamais ocorreria no mundo atual, neste tempo em que contamos com incríveis meios instantâneos de comunicação, como a internet.


Nova reação contra a vacina 116 anos depois


Por incrível que pareça, neste ano de 2020, uma antes inimaginável pandemia envolve inteiramente o planeta numa apavorante escalada de contaminações aos milhões e de mortes incontáveis. O Brasil, contudo, parece continuar habitado por pessoas que têm a mentalidade e ignorância ao nível daqueles  que há 116 anos revoltaram-se ante a obrigatoriedade da vacina. Essas pessoas atuais mas de mentalidade primitiva, manifestam-se pelas redes sociais contra a vacina, influenciadas pelo incompetente, obscurantista e negativista atual presidente da República. Desde o começo do contágio no Brasil em fevereiro do ano que está terminando, ao contrário do que se poderia esperar de um estadista, Bolsonaro insurgiu-se contra a existência de uma pandemia, e depois, face ao desesperador aumento de contágios e mortes, desestimulou ao máximo a utilização de vacinas para conter o mal. Sempre que se referiu à pandemia pela covid-19, provocada pelo novo coronavírus, ele menosprezou e até debochou das preocupações dos mais bem informados, e mostrou-se contrário ao uso de máscaras. Há apenas três dias ouvimo-lo, pela televisão, insistindo – em seu doentio negacionismo – que a epidemia no Brasil está “no finalzinho”, quando na verdade ela acaba de atingir índices de expansão catastróficos.

Embora as recomendações das autoridades sanitárias insistam na necessidade de manter-se isolamento social, distanciamento entre as pessoas e uso de máscara, no Natal houve aglomerações e festas por todo o país, e multidões lotam as praias para comemorar o réveillon.  Não respeitam as recomendações para que fiquem em casa nestes feriados de fim de ano. O que veremos será o fatal recrudescimento da nefasta moderna peste, com milhares de crescentes mortes diárias em todo o país, vitimadas pela covid-19.


Classe média sai da quarentena direto para os braços da covid-19 e lota hospitais do Brasil.

Sinto-me inerme para prosseguir comentando as vilanias desse patético e inescrupuloso homem que foi posto na presidência da República, e desanimado ao constatar a profunda ignorância de larga parcela da população brasileira que o segue, aplaude e apoia.  Por isso, para dar um desfecho a este meu artigo, ao ler uma publicação feita ontem pelo meu amigo Rubens Faria Gonçalves, resolvi transcrevê-la na íntegra, já que aquele texto diz exatamente o que eu gostaria de expressar aqui:

Rubens Faria Gonçalves

Palavras de Rubens Faria Gonçalves


“Fico perplexo quando acompanho pela imprensa o aumento vertiginoso dos casos diários de mortos e contaminados pela Covid-19, e mais perplexo fico ao observar o desleixo irresponsável das autoridades políticas e de um grande número da população em relação aos cuidados necessários nas atuais circunstâncias.

Confesso que tudo isso só leva a sentir-me muito triste por ser brasileiro e morar neste país que afunda diariamente qual barco sem rumo com o casco furado, sem tripulação competente e sem capitão, nas ondas de um deus-dará.

Quando o novo governo foi eleito, era fácil antever que viriam tempos nada bons, porém jamais, em momento algum, eu poderia imaginar o cenário desses últimos meses.

No calendário gregoriano, que rege o ano civil no país, o ano termina, outro começa, há comemorações, renovam-se as esperanças, trocam-se votos de Feliz Ano Novo...

Mas que Feliz Ano Novo é esse? Não consigo imaginar um Ano Novo feliz no atual momento histórico.

Não haverá um Feliz Ano Novo enquanto as pessoas não estiverem imunizadas, e isto somente poderá ocorrer quando houver vacinas disponíveis para toda a população.

E não apenas vacinas!

Vacinas, seringas e competência política em quantidade suficiente”.









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terça-feira, 1 de dezembro de 2020

BEM-VINDO O TOQUE DE RECOLHER EM TODO O PARANÁ e UMA CRÍTICA AO PREFEITO DE CURITIBA por Francisco Souto Neto.

 

Em 1º.12.2020: Curitiba em situação gravíssima com o aumento de contaminações pela covid-19. Acima, o gráfico dos casos mês a mês, de março a novembro de 2020.

 

 Comendador Francisco Souto Neto em setembro de 2015

 

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BEM-VINDO O TOQUE DE RECOLHER NO PARANÁ 

e

UMA CRÍTICA AO PREFEITO DE CURITIBA.

 

Francisco Souto Neto

 

 

Rafael Valdomiro Greca de Macedo, prefeito de Curitiba.

Em outubro estávamos numa linha decrescente de contaminações e mortes pela covid-19. A pandemia vinha diminuindo, entretanto é óbvio que permanecia tão perigosa quanto letal. Porém no “feridão” do Dia de Finados curitibanos resolveram descer a serra para passear nas praias paranaenses. Escrevi sobre isso: muitas pessoas acreditando na miragem de que estávamos quase livres da pandemia, resolveram relaxar no protocolo de recomendações de segurança. Assisti pela televisão a reprováveis cenas de praias lotadas não só no Paraná, mas em todo país, e bares repletos de pessoas ignorando a necessidade do isolamento social. Somando-se o mencionado “feriadão” às aglomerações do dia das eleições, era previsível que sofreríamos um retrocesso sob o aspecto epidemiológico ao longo de novembro.

Rafael Greca no pronunciamento de 20.11.2020. Foto que tirei da imagem do meu televisor.

Na noite de 20 de novembro – portanto há apenas dez dias, quando a pandemia já estava em meteórica ascensão em Curitiba e no Paraná – assisti a um pronunciamento do prefeito Rafael Greca através do programa Boa Noite Paraná pela RPC, que me aborreceu. Num desagradável tom professoral, com aquele ar de superioridade bem irritante que é peculiar a esse prefeito, disse ele, ipsis literis: “Não me move a vontade de implantar restrições na cidade. Eu sou um profissional do cuidado. Eu não estou no mundo pra contar culpados. Mas eu quero chamar você [com dedo em riste] a cooperar com a cidade. As medidas restritivas só serão tomadas se houver abusos”. Todavia abusos estavam acontecendo há muito. Só Rafael Greca não via. E mesmo com os índices de contaminações subindo verticalmente, continuava o prefeito com sua conversa mole, obviamente cego às evidências e preocupado principalmente com os empresários que sabem muito bem como encurralá-lo para que ele tome decisões mais favoráveis àquela classe. Nós, a população em geral, não estamos interessados no “Natal de Luz”, aquele capricho de luzes e cores ontem anunciado pelo prefeito. O tempo não é para comemorações, mas para juntar recursos com a finalidade de aumentar o socorro àqueles que precisarão de leitos de UTI nas próximas semanas ou meses.

Rafael Greca no pronunciamento de 20.11.2020

Rafael Greca disse ainda na noite de 20 de novembro: “Também não é verdade que nós cancelamos da agenda da cidade a pandemia durante o tempo eleitoral. O site covid-19 e todo mobiliário urbano, e também as comunicações da Secretaria da Saúde foram mantidas, e por esse registro é que nós sabemos que estávamos com 700 casos por dia, no outro dia tivemos 900 e ontem infelizmente [e com um “dar de ombros” como quem quer dizer “não tenho culpa”] tivemos 1300”. Agora, 1º de dezembro, quando escrevo este artigo, já são mais de 1500 casos diários, e é óbvio que se o prefeito tivesse imposto medidas restritivas bem mais severas e há mais tempo, não estaríamos nesta atual situação aflitiva. Se eu e tantos outros prevíamos, há um mês, as consequências nefastas de um afrouxamento às medidas necessárias, como o prefeito vem empolado declarar que “não me move a intenção de implantar restrições à cidade”? Na verdade, neste recrudescimento da pandemia, restrições são sem dúvida necessárias. Podem ser casos de vida ou morte.

Abaixo, uma sequência de fotografias que fiz em 1º.12.2020 da tela do meu televisor, no momento em que eram divulgados pela RPC os índices que mostram o crescimento explosivo do coronavírus em Curitiba durante o mês de novembro.












Hoje, felizmente, tivemos a primeira decisão do governo estadual no sentido de tentar conter a propagação da covid-19, que decretou a partir de amanhã toque de recolher em todo o Estado do Paraná. Amanhã o decreto será publicado, e espero que não apenas "recomende", mas determine, isto é, imponha a obrigação dos cidadãos paranaenses ao toque de recolher. Das 22 horas às 5 da manhã, ninguém poderá circular pela cidade, excetuados, logicamente, os casos de comprovada necessidade. Alguns municípios, hoje mesmo, 1º de dezembro, já decretaram a cobrança de multas; por exemplo em Umuarama a multa será de até R$5 mil; em Cianorte será o dobro: R$10 mil às pessoas físicas que desobedecerem. Vamos ver se Greca terá a coragem de também cercear eventuais infratores aplicando-lhes multas em caso de desobediência. Não adianta as autoridades apenas afirmarem – e pelo menos isto fazem com determinação – que as pessoas precisam colaborar praticando o distanciamento social, usando máscara e álcool gel, pois o que não falta em grande número são cidadãos relapsos e indisciplinados, que só “colaborarão” se forem forçados a agir civilizadamente ao sentirem-se ameaçados por multas.

Beto Preto, Secretário de Estado da Saúde.

Beto Preto, Secretário de Estado da Saúde, em pronunciamento há pouco, mostra-nos boa vontade no combate ao coronavírus, apesar da imposição do governador Ratinho Júnior pela proteção – prioritária? – aos interesses dos empresários.

Em suma, a situação apresenta-se gravíssima para nós. E se contaminações e mortes continuarem num crescendo, teremos que pressionar as autoridades por um confinamento ou isolamento total do Paraná – isto é, pelo lockdown.


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 Comendador Francisco Souto Neto em dezembro de 2020

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