PORTAL IZA ZILLI
Victor Noir no Cemitério Père-Lachaise em Paris.
Iza Zilli
O incrível cemitério Père-Lachaise
(Paris)
Por Francisco Souto Neto
Prólogo:
cemitérios paulistas e cariocas
Houve
um tempo, talvez até ao começo da segunda metade do século XX, em que no Brasil
os cemitérios paulistas e cariocas atraíam as pessoas que costumavam ir ver as
extraordinárias obras de arte neles existentes. Depois, com o aumento da
pobreza no país e o consequente avanço da violência urbana, os túmulos
começaram a ser vandalizados. Primeiro, os ladrões subtraíam as esculturas, e
mais tarde tudo o que fosse de bronze, das portas e floreiras às simples
maçanetas das capelas, sem que as administrações conseguissem conter os furtos
crescentes.
Atualmente,
cemitérios de grande beleza como a Necrópole São Paulo e o Cemitério da
Consolação, chegaram ao cúmulo de serem frequentados por marginais que assaltam
as pessoas que vão levar flores à memória dos seus entes queridos. Conheço
muito bem essa situação, porque tenho familiares lá sepultados.
No
Rio de Janeiro a situação é mais grave. No Cemitério São Francisco de Paula,
mais conhecido como Cemitério do Catumbi, onde estão sepultados meus trisavós
António José Alves Souto, o Visconde de Souto (1813-1880) e Maria Jacintha de
Freitas Souto, a Viscondessa de Souto (1819-1885), os túmulos têm sido sistematicamente
depredados por vândalos da favela vizinha, da qual o setor histórico da
necrópole – que envolve os setores 1 e 2 – é separado por um simples muro de
contenção. Pobre e violento Brasil!
Isso
certamente jamais aconteceria nos países que alcançaram alto grau de
civilidade. Na Europa, visitas a cemitérios são muito naturais. Turistas
procuram conhecer as necrópoles europeias por diversos motivos, sobretudo,
digamos, movidos pela curiosidade cultural.
Sempre
que passo alguns dias numa cidade da Europa, costumo visitar seus cemitérios, e
as lições apreendidas são invariavelmente surpreendentes. Conheço dezenas de
cemitérios de diversos países do Velho Continente. Hoje vou referir-me à mais
interessante das necrópoles de Paris: o Cemitério Père-Lachaise.
O
cemitério Père-Lachaise
No
ano de 2001 estive em Paris com meu companheiro de muitas viagens, Rubens Faria
Gonçalves, quando fizemos uma visita por toda a tarde ao Cemitério
Père-Lachaise, cujas sepulturas famosas e marcantes esculturas funerárias tornaram-no
um lugar agradável para um passeio sereno e nostálgico. Ali estão inumadas
celebridades de várias épocas, que vão de Abelardo e Heloísa, e de Chopin, a
Oscar Wilde e Jim Morrison.
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1 – Rubens Gonçalves na entrada principal do Cemitério Père-Lachaise de Paris.
De
posse de detalhado mapa que compramos à entrada do Père-Lachaise, começamos a
visitar alguns dos túmulos. Nem sempre é fácil localizá-los, porque pode
acontecer de não estarem nas ruas principais, mas dentro de pequenos labirintos
e becos. Um dos primeiros que encontramos, foi o do compositor Bizet, que nos
remeteu a uma das mais famosas árias da sua ópera “Carmen”: “Près des
ramparts de Seville, chez mon ami Lilas Patia”...
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2 – Souto Neto na sepultura de Bizet.
Um
dos túmulos mais comoventes, talvez pela simplicidade, é o do casal Yves
Montand e Simone Signoret, ambos expoentes da dramaturgia e do cinema francês.
Sobre esse túmulo, os fãs deixaram algumas mensagens gravadas em pequenas
placas de mármore ou granito, que ficam ali sem estar fixadas à campa, mas que
são respeitadas pelos visitantes que jamais as retiram de onde se encontram.
Uma delas diz simplesmente: “A vous deux que j'ai tant aimeé” (“A vocês
dois que eu tanto amei”).
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3 – Sepultura dos atores Simone Signoret e Yves Montand.
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4 – Tumba rústica de Allan Kardek.
O
túmulo mais florido de todo o cemitério é o de Allan Kardek, onde jaz o
fundador da doutrina espírita. O mais feio que visitamos, ao menos na minha
opinião, é o de Sarah Bernhardt, grande diva do teatro. Curioso é que o de
Oscar Wilde, poeta inglês, encimado por estátua art-nouveau de
um anjo alado. Digo que é curioso porque a fachada do túmulo está repleta de
beijos com batom. Pelo que li, batom sobre granito fosco torna-se quase
indelével e seu desgaste pelas intempéries poderá demorar muitos anos.
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5 – Beijos de batom no túmulo de Oscar Wilde.
Melancólico
é o túmulo de Madame Lamboukas, conhecida como Edith Piaf, “o pequeno pardal”
da música francesa. O mais polêmico é o de Victor Noir, jornalista do século
XIX, morto a tiros aos 22 anos pelo príncipe Pierre Bonaparte, primo de Napoleão III.
Sobre tal túmulo está a figura em bronze do jovem morto, que jaz virado para
cima, elegantemente trajado com sobretudo, e belas botas. Ao lado vê-se sua
cartola caída – tudo, é claro, em bronze. Dizem que Victor Noir
estimula a fertilidade. Há três locais da estátua que estão com o bronze polido
de tanto serem tocados por mãos femininas: as pontas das botas, os órgãos
genitais e os lábios. Segundo consta, há mulher que chega ao extremo de se
deitar sobre a figura, na esperança de engravidar (sic). O desgaste nos lábios,
comenta-se em voz baixa, pode ser de tantos beijos ali depositados... Coisa de
gente excêntrica ou, ao que parece, de muito bom-humor.
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6 – Uma turista no túmulo de Victor Noir.
Modigliani
e Jeanne Hébuterne
O
túmulo que meu amigo Rubens mais desejava visitar, e por coincidência também
eu, era o de Amédeo Modigliani, seu – e igualmente meu – pintor predileto.
Italiano que morava em Paris, Modigliani morreu de pneumonia aos 36 anos de
idade, quando apenas começava a conhecer a fama. Os seus retratos com figuras
de longos pescoços são belíssimos. Ele era casado com a jovem francesa Jeanne
Hébuterne, por ele muitas vezes retratada. Para mim, a jovem e apaixonada Hébuterne
é uma das figuras mais comoventes da História da Pintura.
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7 – Retrato de Jeanne Hébuterne feito por Modigliani.
Acrescente-se
que ela, não suportando a morte do marido, suicidou-se no dia seguinte, aos 22
anos, atirando-se da sacada do 5º andar do prédio onde moravam. Eu, que sempre
me perguntei onde estaria ela sepultada, descobri naquela tarde que Jeanne
Hébuterne e Modigliani estão juntos na mesma sepultura. Na campa, abaixo do
nome do pintor, consta o dela: “Jeanne Hébuterne, di Amédeu Modigliani
compagna devota fino all estremo sacrifizio” (“...de Amadeu Modigliani a
companheira devota até ao extremo sacrifício”).
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8 – Túmulo de Modigliani e Jeanne Hébuterne.
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9 – Elevados como se fossem duas piras, os túmulos de La Fontaine e Molière.
Foram
centenas os jazigos que admiramos, dentre os quais o do poeta e
fabulista La Fontaine, ao lado do dramaturgo Molière.
O
último a visitarmos, talvez o mais belo de todo o cemitério, com delicadas
colunas e ogivas góticas, foi o de Abelardo e Heloísa. Teólogo e filósofo,
Abelardo amava Heloísa, sobrinha do cônego Fulbert que, contrário ao romance,
mandou castrá-lo. As cartas trocadas entre os amantes é uma das mais belas
obras literárias da Idade Média. O casal pôde ser unido somente na morte, no
Cemitério Père Lachaise.
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10 – Belíssima tumba de Abelardo e Heloísa.
Vale
registrar que também visitamos o Columbarium, muito bonito e em grande parte
subterrâneo. Ali estão guardadas as cinzas dos que foram cremados. Localizamos
o lóculo da dançarina Isadora Duncan, morta num acidente de carro, estrangulada
por sua écharpe, e também o de Maria Callas, grande diva da ópera.
A placa com o nome desta última, foi colocada por um fã-clube e não pelos
familiares, que a detestavam, porque a Callas, a mais famosa soprano de todos
os tempos, não dava a mínima importância a seus familiares, nem mesmo à própria
mãe.
Ao
deixarmos o cemitério, fizemos de conta que os espíritos daqueles cujos túmulos
visitamos, acompanharam-nos festivamente até ao portão.
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OBSERVAÇÃO:
As fotografias acima, de 1 a 10, foram tiradas por Francisco Souto Neto e Rubens Faria Gonçalves no Cemitério Père-Lachaise. Adiante, outras dez fotos curiosas e atrevidas de manifestações sobre o túmulo de VICTOR NOIR encontradas na internet:
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11 – Túmulo de Victor Noir
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12 – Loucuras sobre o túmulo de Victor Noir
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14 – Loucuras sobre o túmulo de Victor Noir
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16 – Loucuras sobre o túmulo de Victor Noir
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17 – Loucuras sobre o túmulo de Victor Noir
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18 – Loucuras sobre o túmulo de Victor Noir
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19 – Loucuras sobre o túmulo de Victor Noir
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20 – Os lábios desgastados pelo excesso de beijos. Será que Victor Noir jamais
conseguirá descansar em paz?
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FILME
Um
filme de apenas 7 minutos enviado ao YouTube em 2008 por Rubens Faria
Gonçalves, registra o seu passeio com Francisco Souto Neto entre os túmulos do
Cemitério Père-Lachaise, neste link:
O MAPA
Mapa parcial do "Cimetière du Père-Lachaise"
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