sexta-feira, 16 de junho de 2023

EM CHUR: “O SEGREDO MAIS BEM GUARDADO DA SUÍÇA” PARTE 2 CHEGANDO A CHUR, CAPITAL DOS GRISÕES por Francisco Souto Neto.


Chur atualmente e bondinho aéreo para uma de suas montanhas.

 
Comendador Francisco Souto Neto

 

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EM CHUR:

 “O SEGREDO MAIS BEM GUARDADO DA SUÍÇA” 

PARTE 2

 

CHEGANDO A CHUR, CAPITAL DOS GRISONS

 

por  Francisco Souto Neto

 

 

Chur tem tem três nomes oficiais: Chur, Cuera e Cuoira. É a mais antiga cidade da Suíça, com registros de ocupação datando de 3000 a.C. Portanto, uma cidade com 5000 anos de História.


Estação ferroviária de Chur.

A ideia de conhecermos Chur em nossa viagem de 1999 foi do meu amigo Rubens Faria Gonçalves.  Ele tinha visto no Canal Travel Channel um documentário sobre a estrada de ferro Chur-Arosa, apresentada como “o segredo [turístico] mais bem guardado da Suíça”: era um trem de ferrovia particular que partia de uma rua em frente à estação ferroviária (com o embarque, pode-se dizer, feito na calçada) que ia pelo meio das ruas de trânsito normal até sair da cidade, atravessava parte dos Alpes e chegava à cidade de Arosa. O mais engraçado é que o último vagão da composição é como um grande caixote de madeira aberto, chamado de “carrozza panorâmica”. Na época, o Rubens disse: “Quero viajar no caixote” e eu assimilei a ideia instantaneamente, é claro! E resolvemos realizar o plano que ficou embutido numa viagem bem maior que fizemos através da Europa.

O Hotel Drei Könige

A nossa reserva no Hotel Drei Könige (Hotel Três Reis Magos) estava em ordem. A recepcionista, ultra-simpática, encontrava-se à nossa espera, falando inglês com forte sotaque alemão. Recebemos dela duas caixas como presentes de boas-vindas, cheias de chocolates e agrados variados.


Hotel Drei Könige

 
Francisco Souto Neto no saguão do Hotel Drei Könige, onde há, entre muitas outras, uma obra de arte na forma de uma cadeira muito original, assinada pelo autor.

Do outro lado da rua, em frente ao Hotel Drei Könige, há uma interessante pintura na parede, junto à qual Rubens fotografa Souto Neto.


O saguão do hotel era uma verdadeira galeria de arte e o prédio é histórico, do século 17. Nós ouvimos um latido de cachorro que vinha da sala da gerência mas, infelizmente, não vimos o animal. Nós o veríamos somente no nosso último dia em Chur. O quarto era excelente, com móveis típicos dos Grisons, quase uma pequena suíte com mesa e poltronas de estilo, rendas sobre os móveis e cortinas. Havia um ótimo banheiro com banheira e duas pias separadas.

Eram 21:30 horas e precisávamos jantar, e fui, apesar do adiantado da hora, mas apenas em consideração ao Rubens. Eu somente belisquei os pratos. O sistema era de pratos fixos, sem possibilidade de opção. Veio então a sopa, um caldo ralo com coisas boiando, que o Rubens identificou como tutano, uma iguaria suíça-alemã, mas insuportável para mim. A salada, para compensar, era linda e o prato principal trazia escalope grelhado, ótimo. A sobremesa, então, nem se fala: frutas da estação em pedacinhos com creme de chantilly.

Um dia soft

No dia seguinte fomos à estação ferroviária e vimos os trens. Dentro da estação estão as linhas normais, para todos os lados do país e da Europa. Na rua, em frente à estação, estava “estacionada” na calçada uma composição de onze vagões, o último dos quais o “caixote aberto”, com placas em suas laterais que diziam: “carrozza panorâmica”. “Oba!”, exclamamos. Caixote ou carroça, era naquilo mesmo que iríamos viajar no dia seguinte. Logo vimos o trem partir e corremos atrás dele, vendo-o seguir pelas ruas entre carros e pessoas. Incrível!

O trem Chur-Arosa com o vagão “caixote” (carrozza), no qual viajaríamos no dia seguinte.

O trem Chur-Arosa com o vagão “caixote” (carrozza), no qual viajaríamos no dia seguinte.

O trem sai pelo meio da rua em direção a Arosa. Vemos que vários passageiros preferem fazer a viagem na carrozza.

Quando nós chegamos a uma cidade, gostamos de passar o primeiro dia mais descompromissadamente, para sentir-lhe o clima e conhecer o seu jeito. Assim, passeamos pelo setor histórico vendo as casas com pinturas nas fachadas datadas principalmente dos anos de 1400 a 1500!


Aspectos de Chur: Rubens Faria Gonçalves na rua principal, ao lado de bicicletas, tão comuns na Suíça.

Centro da cidade.

Souto Neto no cemitério local.

Ao fundo, a torre da riquíssima Igreja de San Martin.

Atrás de Souto Neto, o Obertor, que é o principal portão da cidade, erguido na Idade Média.

Flores dos jardins de Chur.

Com estátua (de uma exposição temporária) numa rua de Chur.

Com estátua (de uma exposição temporária) numa rua de Chur. 

Às duas da tarde voltamos ao hotel, mas nosso quarto ainda não tinha sido arrumado. Que chato! Demos mais um tempo e fomos ao norte da cidade para conhecer sua impressionante catedral romanesca e gótica, construída entre os séculos 12 e 13. Voltamos ao hotel às 16,30 horas e o quarto continuava desarrumado. Desci e reclamei a Mrs. Pröll que se desculpou e me disse que o quarto seria arrumado enquanto jantássemos.

Um aborrecimento no jantar

Para jantar tive um incidente com a jovem Mrs. Pröll. Eu queria saber qual o horário do jantar, e se seria no térreo ou no 1º andar. Ela falava muito e eu não entendia nada. Eu me desculpava por nada entender e voltava a pedir bem claramente em inglês: “Diga-me, por favor, apenas a hora do jantar e onde”. E ela tornava a falar rapidamente mil coisas com aquele sotaque pesado, pois os principais idiomas de Chur são o alemão e o romanche. Até que ela perdeu a paciência fazendo gestos e expressão facial que considerei um insulto. Reagi reclamando alto e zangado, em inglês: “Meu idioma é o português, que falo muito bem. Eu sou advogado e jornalista. Mas falo mal o inglês e não entendo o que a senhora está dizendo! Sinto muito!”. Detalhe: não terminei falando alto, mas gritando. É claro que meu inglês não era suficiente para eu dizer-lhe o que realmente queria dizer e que ela merecia ouvir, mas ao berrar-lhe nos ouvidos, ela compreendeu a dimensão da minha insatisfação. Às vezes é preciso ser grosseiro para se impor! Ela abrandou e conduziu-nos imediatamente ao restaurante ainda vazio. Por azar nosso, a garçonete portuguesa simpática do dia anterior não estava presente, e foi a própria Mrs. Pröll quem nos serviu o jantar. Ela ia servindo com sorriso forçado e sem simpatia. Mas puxou conversa: “Brasil? Samba? Tango?”. Eu respondi que não gosto de samba, que é do Brasil, e que gosto de tango, que é de outro país chamado Argentina”. O Rubens disse-me que eu estava sendo hostil no momento em que ela tentava um contato. A bem da verdade, eu não pretendi ser hostil, mas sentia-me ainda irritado. E lá voltou ela trazendo-nos o segundo prato. Foi quando ela sem querer bateu no copo do Rubens, entornando toda a água sobre a mesa. “Oh, perdoem-me!”, sobressaltou-se Mrs. Pröll, muito embaraçada. O Rubens foi rápido em inglês: “Nenhum problema! Não se preocupe!”. Eu reforcei, também com um sorriso: “Nenhum problema. Está tudo okay”. A partir daí, foi que ela pareceu ficar simpática de verdade, ao que eu procurei corresponder. Ao final nossos contatos ficaram sinceramente equilibrados e corteses.

Eu não me sinto culpado por não entender muito bem o inglês oral, porém entendo bem mais o escrito, e viajo tranquilamente para qualquer país do mundo sem lhe conhecer o idioma. Tenho certa aversão ao inglês estadunidense (entendo melhor o inglês britânico) e nunca senti vontade de aperfeiçoá-lo, talvez porque eu não goste da atitude do norte-americano comum que costuma agir como se fosse dono do mundo, e nós, fundo do seu quintal.

A noite em Chur é vazia. As vitrines são iluminadas, há gente nos bares, mas ninguém nas ruas. Numa livraria onde vendiam cartões postais, encontrei um que dizia “Chur at night”, e essas palavras pairavam sobre um fundo inteiramente negro. Tivemos que rir ante tamanha verdade.

E o quarto do hotel? Ficou mesmo sem ser arrumado. Resolvemos não voltar a reclamar para evitar atritos maiores, e esperar para ver como seria no dia seguinte. Às vezes um pouco de tolerância não faz mal a ninguém.

No dia seguinte nós, finalmente, iríamos passear em Arosa viajando dentro de um caixote aberto.

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CONTINUA E TERMINA NA

PARTE 3

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