Comendador Francisco Souto Neto
RUA COMENDADOR ARAÚJO EM CURITIBA:
PASSADO E PRESENTE
Francisco Souto Neto
Quem
teria sido aquele tal comendador Araújo que deu nome a uma das mais importantes
ruas da capital paranaense? Ele foi um notável ervateiro nascido em 6 de
novembro de 1818, chamado Antônio Alves de Araújo, mais conhecido como comendador Araújo, e exerceu o cargo de
vice-presidente da Província (hoje Estado) do Paraná. Em duas oportunidades
assumiu a presidência interina da Província
(atual cargo de governador), de 26 de maio a 3 de setembro de 1883 e de
24 de agosto a 18 de setembro de 1885. Araújo morreu em 22 de abril de 1887, na
cidade de Palmeira, a 70 km de Curitiba.
Antônio Alves de Araújo (1818-1888), o comendador Araújo.
A Rua
Comendador Araújo, uma das mais antigas e tradicionais vias públicas de
Curitiba, tem apenas seis quarteirões e um quilômetro e meio de extensão. Ela
começa na Praça Osório, em oposição à Rua XV de Novembro (antiga Rua das
Flores) e no século XIX chamava-se “Estrada de Mato Grosso”. Ali, na Praça
Osório, em 16 de abril de 1871, iniciou-se a estrada para Campo Largo, seguindo o caminho formado atualmente pela Avenida Batel e, mais adiante, pela Rua
Eduardo Sprada, rumo ao Segundo Planalto. Atravessando os atuais Estados do
Paraná e de São Paulo, chegava ao antigo Mato Grosso, atual Mato Grosso do Sul,
e deveria atravessar o continente, por isso foi também chamada de “Estrada do
Oceano Pacífico”.
Com a
passagem das décadas a Rua Comendador Araújo foi se transformando em via urbana
e recebendo edificações. Os abastados donos de engenhos foram construindo ali
as suas residências.
No local
onde a Comendador Araújo “desemboca” na Av. do Batel, encontravam-se vários moinhos de erva-mate, produto que, na
passagem do século XIX para o XX, alavancou a economia paranaense. Tal posição
geográfica propiciou a implantação de uma moderna infraestrutura e a rua, já
consolidada no núcleo urbano em 1894, recebeu pavimentação, iluminação pública,
linha de bondes e passou a abrigar luxuosas casas comerciais e elegantes palacetes de tendência eclética, que se tornaram testemunhos do enorme
desenvolvimento econômico da época.. Há um século, entre as décadas de 10 e 20,
a Comendador Araújo já era considerada um endereço requintado.
Rua Comendador Araújo no começo do século XX, com o Palacete Ascânio Miró à direita.
Um bonde passando pela Rua Comendador Araújo.
Esquina da Comendador Araújo com a Coronel
Dulcídio. À direita, a casa de Vicente Machado, onde hoje funciona um sofisticado salão de beleza chamado Casa W". No lugar do belo palacete à esquerda, hoje existe um prédio da Copel.
Esquina da Comendador Araújo com a Brigadeiro
Franco. À direita, o Museu David Carneiro, hoje uma das entradas para o Hotel Pestana, quase em frente ao Edifício Canadá.
Hoje,
além dos comércios, a rua é ocupada por hotéis, alguns de luxo; bares;
incontáveis restaurantes e galerias, e a tradicional Sociedade Thalia. Abriga o Omar Shopping, que é bem mais uma galeria, e o
requintado Shopping Crystal, que conta com alguns cinemas (Salas Itaú),
considerados pelos cinéfilos como “cines de arte” por exibirem não apenas
filmes norte-americanos, mas também europeus e ainda aqueles que não costumam
passar nos "circuitos comerciais”. Na esquina com a Rua Visconde do Rio Branco que no começo do século
XX era a estação de bondes, e lá pelas décadas de 50 e 60 foi a loja de carros
Slaviero, localiza-se agora o Edifício Universe Life Square, que em 2018 é o
prédio mais alto de Curitiba e do Paraná, com 43 andares de 153 metros. A uns 200 metros dali, na mesma rua, está o segundo prédio mais alto da capital, o Evolution Corporate (Hotel Pestana), com 40 andares e 137 metros de altura, construído onde existiu o Museu David Carneiro. Apesar
das enormes novas construções, a Comendador Araújo ainda guarda muito do seu
charme histórico.
Entrando pela Praça Osório no primeiro quarteirão
da Rua Comendador Araújo – que é só para pedestres –, ao olhar para trás, mais
exatamente para a esquina da praça apontada para o Sul, há um belíssimo
palacete amarelo que foi mandado erguer por Affonso Alves de Camargo,
presidente do Paraná de 1916 a 1920 e de 1928 a 1930. Depois, aí residiu Flora
Munhoz da Rocha, que se casou com Bento Munhoz da Rocha, governador do Paraná
de 1951 a 1955. Agora funciona ali o restaurante Nelbe.
O primeiro e curto quarteirão da Rua Comendador Araújo
termina aqui, onde é cortado pela Rua Visconde de Nácar. No segundo
quarteirão torna-se uma via normal para veículos. À direita, as duas torres
residenciais do Edifício Gemini, construído em 1970, belíssimo projeto do
arquiteto Elgson Ribeiro Gomes (1923 – 2014), um dos mais importantes
responsáveis pela verticalização de Curitiba em meados do século passado.
Devido ao “rendado” do setor que abriga as garagens dos moradores, recebeu o
apelido de “Edifício Mulher Rendeira”. Na mesma rua há mais dois prédios
igualmente emblemáticos projetados pelo mesmo arquiteto.
À direita, as garagens do Edifício Gemini (“Mulher
Rendeira”).
As duas torres residenciais do Edifício Gemini (“Mulher Rendeira”).
A belíssima “renda” do Edifício Gemini.
A Rua Comendador Araújo foi a primeira de Curitiba
que eliminou os postes que continham fiação aérea, isto é, fios elétricos e telefônicos suspensos, e de televisão por assinatura, substituindo-os por antigas e belas
luminárias. Acima, a atividade registrada no dia 6 de setembro de 2014. (Foto da internet)
As redes de energia elétrica e fibra ótica foram
transferidas para dutos subterrâneos. (Foto da internet)
No segundo quarteirão, o Executive Center Everest,
de 1975, com sua galeria dupla que se conecta, nos fundos, com a Rua 24 horas.
O Everest, exemplo típico da arquitetura estilo brutalista.
Na esquina com a Visconde do Rio Branco está a Casa
Glaser, de 1914, um dos estabelecimentos mais antigos da capital. Antigamente
era parte do comércio de secos e molhados, depois loja de ferragens, e nas
últimas décadas de cristais. Em frente ao imóvel, do outro lado da rua, está o
Universe Life Square, um prédio novo, o mais alto da cidade.
O Universe Life Square, que em 2018 é o prédio mais
alto de Curitiba e do Paraná, com 43 andares de 153 metros. Nesse lugar, nas
primeiras décadas do século XX existia a estação de bondes, onde estes eram
recolhidos à noite. Em meados do século, anos 60, nessa esquina existiu a loja
de automóveis da Ford, a famosa Slaviero. O Sr. Ercílio Slaviero, principal
acionista, residiu dois quarteirões acima, na mesma Rua Comendador Araújo, no
Edifício Canadá, projeto do já citado engenheiro Elgson Ribeiro Gomes.
Mais uma vista do Universe Life Square, o maior prédio de Curitiba e do Paraná, um pouco mais de longe.
Ainda na mesma esquina com a Visconde do Rio
Branco, contrapondo-se ao Edifício Universe Life Square, ergue-se o majestoso
Edifício Paraná, um quadrilátero azulado de linhas retas e harmoniosas, este
também projetado por Elgson Ribeiro Gomes.
Aspectos da Comendador Araújo com seus ipês-roxos.
Aspectos da Comendador Araújo com seus ipês-roxos.
Aspectos da Comendador Araújo com seus ipês-roxos.
No número 268 da
Comendador Araújo está o Omar Shopping, uma galeria de dois pisos que atravessa
o quarteirão até à Av.Vicente Machado. Ele foi o casarão de Manuel Miró, e
depois a primeira sede da UFPR.
Ao lado, está a sede da Sociedade Thalia, com suas
características ecléticas e vitrais na fachada. Ela teve sua origem ligada à
colonização alemã. A presença das comunidades estrangeiras era muito forte no
Sul do país, e muitas instituições sociais e esportivas tinham suas
denominações nas línguas originais dos imigrantes. Esta foi fundada em 1882 sob
o nome de “Weringe Thalia”, que teve as atas das reuniões de diretoria e
conselhos escritas em alemão até 1918, quando, por força de Lei, passaram a ser
escritas em português durante a Primeira Guerra Mundial.
Do outro lado da rua, a Escola de Música e a Igreja
Presbiteriana, cuja construção começou em 1894.
No número 560 existe o Edifício Canadá, o primeiro dos três prédios, nesta mesma rua, projetados pelo arquiteto Elgson Ribeiro Gomes, que tem a fachada com vidraças do teto ao chão,
com 18 andares. Um dos mais icônicos e, na época (1962), considerado um dos mais elegantes edifícios da cidade, foi o
primeiro em Curitiba com um apartamento por andar e também o primeiro a adotar
esquadrias de alumínio. O salão principal dos apartamentos, rente ao paredão de vidro da
fachada com mais de 12 metros de extensão, tem o piso em mármore branco. O deputado João Vargas de Oliveira e o empresário Ercílio Slaviero (ambos amigos de Arary Souto, meu pai) foram alguns dos seus primeiros moradores.
Foto encontrada na internet que mostra uma empresa, a "WM Tratar Pisos", efetuando o restauro e polimento do piso de mármore na sala de visitas de um dos apartamentos do Edifício Canadá. Pode-se notar o "antes e depois" do restauro que restituiu o efeito de um espelho no piso, devolvendo beleza aos imensos janelões que compõem a fachada do prédio.
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O casarão acima foi construído em 1880 em estilo
clássico pelo engenheiro Monteiro de Carvalho, a pedido de um imigrante alemão.
A mansão já abrigou famílias tradicionais, depois entrou em decadência até
ganhar vida mais uma vez, quando comprada pelo Hotel Íbis. O hotel de uns 10
andares foi construído no miolo do quarteirão, porque o casarão é tombado pelo
Patrimônio Histórico e Artístico e agora serve como restaurante do hotel.
Maravilhosa calçada em frente ao Hotel Ibis.
Aspectos da Rua Comendador Araújo. Um casal fotografa-se no tapete de flores que cobre o chão.
Aspectos da Rua Comendador Araújo com Rubens Faria Gonçalves.
Aspectos da Rua Comendador Araújo com Francisco Souto Neto.
Aspectos da Rua Comendador Araújo com seu maravilhoso tapete de flores caídas.
Mansão em estilo português (mas que me lembra o florentino) é hoje uma loja de tapetes importados.
A mesma mansão vista em detalhe na foto anterior.
Vista do alto, uma das mais emblemáticas mansões da Comendador Araújo, na esquina com Alameda Presidente Taunay, é o Palacete Ascânio Miró, de 1898, projeto de Cândido de Abreu.
O Palacete Ascânio Miró, infelizmente, está à venda, vulnerável a invasões, mas certamente imune à demolição por tratar-se de imóvel tombado.
A placa de "vende-se" é um triste detalhe no Palacete Ascânio Miró.
A mesma mansão vista em detalhe na foto anterior.
Vista do alto, uma das mais emblemáticas mansões da Comendador Araújo, na esquina com Alameda Presidente Taunay, é o Palacete Ascânio Miró, de 1898, projeto de Cândido de Abreu.
O Palacete Ascânio Miró, infelizmente, está à venda, vulnerável a invasões, mas certamente imune à demolição por tratar-se de imóvel tombado.
A placa de "vende-se" é um triste detalhe no Palacete Ascânio Miró.
Na Comendador Araújo em frente ao início da Alameda Presidente Taunay, encontra-se o Shopping Center Crystal.
Ao lado da porta de entrada para o Shopping Center Crystal, um bebedouro para cães grandes e pequenos, cujo ingresso no shopping é permitido, tal como costuma ocorrer nas melhores capitais do mundo.
Neste casarão funcionou a Galeria Cocaco, a primeira galeria de arte de Curitiba.
Casa Mueller (1917), que pertenceu à Família Gomm Mueller, exemplo de arquitetura alemã, é um dos belos palacetes da Comendador Araújo, onde agora funciona o Instituto DECLATRA - Defesa da Classe Trabalhadora (Advogados).
Rua Comendador Araújo, um oásis de beleza e história no centro da capital. Os três primeiros quarteirões da rua estão no centro, e os três últimos no bairro do Batel.
Vista do alto, linda mansão onde hoje funciona um restaurante.
Na esquina da Comendador Araújo com a Coronel Dulcídio existe esta mansão, que alguns dizem ser do século 18, onde atualmente funciona a Casa W, um sofisticado salão de beleza.
A mesma mansão da fotografia anterior, vista de frente. Amplie a foto e veja o delicado rendilhado da cerca e das sacadas de ferro.
Os contrastes arquiteturais da Comendador Araújo: o esverdeado prédio moderno à esquerda, e o clássico Edifício Canadá ao centro.
-o-
Linda reportagem histórica. Adoro essa rua, seus ipês, seu charme e seus casarões que dariam filmes para a Vampirelle, nossa vampira de Curitiba. Que legal esse trabalho de pesquisa e curiosidades sobre essa magnífica arquitetura, que felizmente está bem preservada.
ResponderExcluirQuerida Dirosa (Dione Mara), obrigado por registrar suas impressões no meu blog. A Vampirelle naqueles ambientes ficaria o máximo. Beijos a você e Isabelle.
ExcluirQue belo artigo, muito bem escrito e rico em imagens. Dá até vontade de morar nessa rua!
ResponderExcluirOi, Rubens! Obrigado pelo elogio ao meu artigo. A Rua Comendador Araújo é mesmo linda. Eu também gostaria de morar ali...
ExcluirEspetacular resgate de memórias e registro de sensações que ainda são renovadas na Comendador. Muito bom caminhar no tempo com sua maestria e dedicação aos diversos aspectos que a formaram. Urbanismo e pessoas são nossa cidade. Lá no pequeno trecho o coração bate forte. Muito obrigado
ResponderExcluirCaríssimo confrade e amigo João Carlos!
ResponderExcluirMuito grato por sua apreciação acima. Sinto-me feliz por você ter gostado e por saber que também para você a Comendador Araújo leva a memórias ancestrais. Obrigado e um grande abraço!
maravilhoso resgate meu amigo.
ResponderExcluirObrigado pelo elogio e estímulo.
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