quinta-feira, 9 de junho de 2016

PARIS NA SINGELEZA DE UM DIÁRIO DE VIAGEM por FRANCISCO SOUTO NETO para o PORTAL IZA ZILLI.

PORTAL IZA ZILLI

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Teto da Santa Capela em Paris.


Iza Zilli


Comendador Francisco Souto Neto

Paris na singeleza de um diário de viagem

Francisco Souto Neto

Quando eu viajo ao Exterior, tenho o hábito de escrever um diário. Faço um registro singelo e despretensioso das minhas andanças pelas ruas das cidades que visito. Jamais pensei em mostrar para amigos, muito menos publicar. Entretanto agora, ao reler as minhas próprias palavras, mudei de ideia por acreditar que poderá ser uma divertida leitura para quem se interessar, além de constituir um roteiro de sugestões turísticas. São impressões da última viagem que fiz a Paris. Estava na companhia do meu amigo Rubens Faria Gonçalves, quando lá permanecemos durante sete dias e oito noites. Meu relato abaixo, que vai entre aspas, feito num dos dias da nossa estada na Cidade Luz, serve para evidenciar que se trata da transcrição dos meus próprios escritos feitos há quinze anos... mas que continuam impressionantemente atuais.

As lojas dos antiquários, o parque de diversões das Tulherias, o senhor idoso de patinete e a Rue St. Denis noturna

“Foram muitos os passeios que até agora fizemos por Paris, vendo coisas novas e revendo outras. Não vou me deter nos detalhes, exceto que fomos conhecer o ‘Louvre des Antiquaires’, que consiste num quarteirão inteiro ao lado do Museu do Louvre inteiramente tomado por lojas de antiquários, cujos acervos são compostos por tesouros da arte mundial vendidos a preços inimagináveis.


FOTO 1 – O Louvre des Antiquaires

FOTO 2 – Atena Gallery, uma das lojas do Louvre des Antiquaires.

Fomos também ao Museu do Louvre, não ao museu propriamente dito – pois já o conhecemos no passado – mas entramos pela Grande Pirâmide, fomos ver as lojas e livrarias do subsolo e andamos entre as fundações medievais até sairmos pelo Arco do Carrossel, tendo passado pela Pirâmide Invertida que eu ainda não conhecia. Toda aquela área estava em escavações na primeira metade da década de 90.

FOTO 3 – A Pirâmide Invertida.

FOTO 4 – Francisco Souto Neto na Pirâmide Invertida do Louvre.

FOTO 5 – Rubens Faria Gonçalves nos subterrâneos das fundações medievais do Museu do Louvre.

O Jardim das Tulherias, na margem oposta ao Sena, está todo tomado por um parque de diversões, um dos mais ricos que já vi em toda a vida, excetuado, é claro, o Tívoli de Copenhague, que é hors-concours. Havia no parque duas ‘casas malucas’ [nas quais o Rubens queria entrar e eu me recusei por medo de levar tombos muito perigosos], além de outros brinquedos, comilanças incríveis, duas imensas rodas-gigantes e um estranho equipamento redondo, uma esfera metálica, para ejeção de pessoas em apenas quatro segundos a 60 metros de altura. As pessoas, de duas em duas, vão e voltam várias vezes, como se fosse numa espécie de “bungee jumping”, soltando gritos de terror.

Numa das noites, ao passarmos por uma rua paralela à du Rivoli, atrás do Louvre, vimos uma área que durante o dia serve de estacionamento de automóveis, e à noite é ocupada por patinadores. Ficam ali os jovens e os não tão jovens patinando ou sobre patinetes. Vimos um senhor de cabelos brancos e roupa tradicional que brincava animadamente com seu patinete. Ele ia, voltava, fazia as curvas em grande velocidade e nós comentamos que no Brasil um idoso brincando com patinete certamente seria discriminado por preconceito. Nem posso dizer que ele era ‘aceito’ pelos jovens daquele local, porque acho que nem sequer era notado. Andar de patinete é moda aqui em Paris, até entre senhoras e executivos que vão de terno e gravata empurrando o minúsculo veículo com um dos pés. Aí está um dos méritos de Paris: o pensamento evoluído, o respeito à liberdade alheia. Em Curitiba não daria nem para tentar, porque as calçadas são uma vergonha de tão irregulares.

FOTO 6 – No Hôtel Bellevue et Du Chariot D’Or, Rubens Faria Gonçalves no terraço do apartamento do 3º andar, fotografado por Francisco Souto Neto.

FOTO 7 – A Rue du Turbigo vista do terraço do apartamento.

A Rue du Turbigo, onde ficamos hospedados, é paralela à Rue St. Denis, esta última tomada por lojas de pornografia e teatros e cinemas com atividades similares. Ao descobrimos isso, achamos que à noite aquela região poderia ser perigosa, porém depois percebemos que podíamos passar por ali em segurança sempre que íamos para o nosso hotel, o Hôtel Bellevue et Du Chariot D’Or. Paris não chega a parecer ameaçadora à noite”.

Les Ateliers de la Tapisserie Française

“A única compra grande que fiz em toda a viagem foi em Paris. Há anos eu planejava possuir uma tapeçaria que tivesse como motivo o unicórnio, e fiz muitas pesquisas que me levaram ao endereço de Les Ateliers de la Tapisserie Française. Ali as tapeçarias são feitas artesanalmente, do mesmo modo que na Idade Média. A confecção é não-mecânica. De posse do catálogo que recebi ainda no Brasil, escolhi La Licorne Captive (O Unicórnio Aprisionado) e fui à Rue de Chichy disposto a fazer a compra apesar do alto preço, e a enfrentar a alfândega brasileira. Fomos recebidos entusiasticamente pelo Monsieur Wehller, com quem eu já trocara vários e-mails e que estava à minha espera. Adquiri também duas almofadas denominadas ‘Dama ao Órgão’ e ‘Flores de Lis’.”

FOTO 8 – “La Licorne Captive” (“O Unicórnio Capturado”), tapeçaria artesanal feita na técnica medieval “mille fleurs” (“mil flores”).

FOTO 9 – Na porta do terraço de seu apartamento no Hôtel Bellevue et Du Chariot D’Or, Francisco Souto Neto exibe a tapeçaria comprada, “La Licorne Captive”, em foto de Rubens Faria Gonçalves.

O tombo da caixa gordinha

“Descobrimos um Flunch [restaurante popular, ‘self service’, para refeições rápidas] em Les Halles, onde estivemos várias vezes tomando refeições. Uma das funcionárias do caixa era gordinha, com um jeito divertido porque usava o cabelo ‘corte-de-tigela’ e tinha um rosto com traços galináceos. Numa das vezes em que lá estivemos, vi quando uma freguesa, após pagar à caixa gordinha, derrubou sua bandeja com um estrondo, esparramando a comida pelo chão. Sentimos pena da freguesa. Logo veio um funcionário que limpou o chão, mas acho que o fez precariamente, porque alguns instantes depois, a caixa gorda ficou muito zangada por algum motivo que nós não entendemos, gesticulou muito com o freguês e saiu rapidamente do recinto do caixa. Ao pisar sobre os restos de gordura, escorregou espetacularmente e caiu sentada na gosma. Cinco pessoas ajudaram-na a levantar-se e ela ria alto, esquecida da zanga de alguns segundos antes”.

FOTO 10 – Restaurante “self service” Flunch, para refeições rápidas e de excelente qualidade.

A feira da Rive Droîte

“Um dos passeios que fizemos hoje merece destaque, que foi andar ao léu pela Rive Droît [margem direita do Sena] – uma experiência interessante. Ao longo de uns quarteirões estende-se o mercado de flores, belas e estranhas, e de... animais! A parte dos animais é tão variada que o visitante se esquece das horas. Descobrimos ali filhotes à venda dos cães com-cara-de-gente. Anoitei seus nomes: chamam-se ‘bouledogues françaises’. Há outros da raça ‘bulldog anglais’. Vendem também gatos, aves de variadas procedências, galinhas de diversos tipos e outros animais bem estranhos para nós”.


FOTO 11 – Mercado de aves na Rive Droît (margem direita).

A Catedral de Notre-Dame

“Esquecia-me de anotar que noutro dia, quando fomos à Catedral de Notre-Dame, desistimos porque a fila para entrar atravessava a praça. Ao retornarmos ontem, a fila era ainda maior. Sem outra alternativa, enfrentamos a fila. Quando finalmente entramos no templo (onde já estive outras vezes, quando não havia fila para entrar), ficamos impressionados com a multidão que lá estava. Uma enchente humana! U’a massa compacta que se movia sempre numa mesma direção, mas lentamente, cabeças voltadas para cima, exclamando muitos ‘oh!’. Era tanta gente que não dava para apreciar com calma a magnífica construção, seus vitrais e as obras de arte. Ao nosso lado, uma visitante chorava copiosamente e ao mesmo tempo sorria extasiada olhando a igreja. Visitar Notre-Dame de Paris talvez fosse dela um antigo sonho?! Quando as vozes dos visitantes ficavam altas demais, pelos alto-falantes ouvia-se: ‘Psiuuuuuu! Silence, s’il vous plaît’. As vozes baixavam instantaneamente por uns momentos, mas logo o burburinho ia aumentando, e os alto-falantes voltavam a impor o silêncio: ‘Psiuuuuuuu!’. Com tanta gente no interior da igreja, olhando e apontando para todos os lados, esvai-se qualquer sensação de solenidade e de religiosidade”.


FOTO 12 – Fila para entrar na Catedral de Notre-Dame de Paris.

A Santa Capela

“A Santa Capela é mais agradável de visitar, talvez porque o alto preço do ingresso desanime as multidões de turistas. Eu já conhecia a Santa Capela, mas o Rubens não, embora ela fique no meio da sinistra Conciergerie, que ambos já visitamos em anos anteriores, ocasião em que conhecemos a cela onde esteve presa Maria Antonieta até ser levada à guilhotina.

Etérea e quase mágica, a Saint-Chapelle é considerada uma das obras-primas arquitetônicas do mundo. Suas paredes são formadas por 15 esplêndidos vitrais separados por colunas muito estreitas. Ela foi construída em 1248 pelo rei Louis IX para abrigar a coroa de espinhos e outras relíquias de Cristo, daí o seu nome: Santa Capela. O preço que ele pagou por essas relíquias foi quase três vezes mais do que lhe custou a construção da Santa Capela. Tão devoto foi o rei Louis IX que a Igreja o canonizou e hoje é conhecido como São Luís. A entrada ao templo se faz por uma capela inferior, também bonita, na qual ficavam os servos e as pessoas comuns, enquanto a maravilhosa capela superior com seus admiráveis vitrais era reservada unicamente ao rei e à família real. Hoje, felizmente, nós (que seríamos a ralé) podemos entrar. Ficamos ali sentados durante bastante tempo, admirando toda aquela beleza. Sempre que vemos coisas interessantíssimas como a Torre Eifell, a Catedral de Notre-Dame ou alguma pintura ou escultora muito famosa, dizemos por brincadeira um ao outro: ‘Mas o que significa isto? Pra que serve?’... e caímos na risada. No interior da Santa Capela foi o Rubens quem tomou a iniciativa da brincadeira: olhou para mim, apontou aos vitrais e indagou: ‘Mas o que significa isso aí?’. Antes que eu, correspondendo à brincadeira, lhe respondesse outra bobagem ainda maior, a moça que estava ao nosso lado perguntou-nos: ‘Ah, são brasileiros?’. Levamos um susto. Acho que ao mesmo tempo a moça pensou algo como: ‘...que brasileiros ignorantes!’.”

FOTO 13 – Aspecto exterior da Santa Capela.


FOTO 14 – As paredes da Santa Capela formadas quase que unicamente por vitrais.



FOTO 15 – O teto da Santa Capela.

Estar em Paris – a Cidade Luz – é sentir aguçada a joie de vivre. Leva-nos a sentirmo-nos, a um só tempo, a criança que ainda vive em todos nós, e o sábio idoso e culto que todos poderemos vir a ser.

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ADENDO ACRESCENTADO EM 1º.9.2016:

Após alguns anos pendurada numa parede, a tapeçaria "La Licorne Captive" ganhou um lugar especial para ficar exposta permanentemente, na sala da biblioteca da residência de Francisco Souto Neto, num painel móvel sobre a estante de livros. O painel foi executado por Projet Mobile, de Everaldo Muniz Padilha, por indicação da Marcenaria Burbank, de André Luiz Ceccatto, ambos de Curitiba. Abaixo, dois ângulos da tapeçaria sobre o painel em fotos de 2016:


FOTO 16 - Em Curitiba, a tapeçaria que se vê nas fotos 8 e 9 acima, agora sobre o painel executado por Projet Mobile.

FOTO 17 - Sala da biblioteca.


FOTO 18 - Os irmãos da Projet Mobile que realizaram o painel deslizante. À direita, Everaldo Muniz Padilha com seu irmão (à esquerda) Luís Alberto Pereira da Silva.

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2 comentários:

  1. Gostei de visitar Paris através de seu olhar.

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    1. Oi, Ci. Muito obrigado por ter lido, gostado e por comentar. É para mim um estímulo para continuar a escrever. Um grande abraço.

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