Igreja Santo Inácio de Loyola (Roma).
PORTAL IZA ZILLI – “IGREJA DE SANTO INÁCIO DE LOYOLA EM ROMA: AS PINTURAS ILUSIONISTAS DE ANDREA POZZO E OUTRAS RIQUEZAS”, coluna do Comendador FRANCISCO SOUTO NETO.
PORTAL IZA ZILLI
Iza Zilli
Portal Iza Zilli em
24.1.2016
Comendador FRANCISCO
SOUTO NETO
IGREJA DE SANTO INÁCIO DE LOYOLA EM
ROMA: AS PINTURAS ILUSIONISTAS DE ANDREA POZZO E OUTRAS RIQUEZAS
Roma é uma
cidade com inúmeras faces. Uma vida inteira seria pouca para se conhecer a
Cidade Eterna em profundidade. Em sua amálgama, ela preserva ruínas dos tempos
dos Césares ao lado de magníficas igrejas renascentistas. Esses templos
católicos são um dos capítulos mais fascinantes e ricos da História Romana.
Além das denominadas “as quatro grandes de Roma”, há dezenas de outras igrejas
com histórias impactantes e arquitetura preciosa, cujos interiores são
obras-primas em termos de esculturas, de pinturas sobre tela e afrescos.
FOTO 1 - A Igreja de Santo Inácio de Loyola
Sempre que vou
à Itália ocupo-me em conhecer igrejas. Numa das viagens que fiz a Roma,
planejara conhecer, dentre outras, a Igreja de Santo Inácio de Loyola (Sant’Ignazio di Loyola a Campo Marzio),
para ver na abóbada a pintura ilusionista de Andrea Pozzo (1642-1709). Há anos
eu desejava conhecer esse templo, que me impressionava através das fotografias
em livros, cujos afrescos foram por mim apelidados na minha infância de “a igreja
dos anjos que caem”, uma referência às personagens da pintura do teto que
parecem pairar tridimensionalmente no espaço.
Uma decepção seguida de um êxtase
Não tive
sorte. Ao entrar na igreja, vi que o teto estava encoberto pelos andaimes de
uma restauração que se fazia na pintura de Pozzo. Foi decepcionante.
Entretanto, enquanto eu filmava um pouco do interior da igreja, alguém começou
a executar no órgão de tubos a Tocata e Fuga em Ré Menor de Bach, e o fazia com
tamanho vigor que foi como se, de repente, o tempo e o espaço deixassem de
existir, dando lugar unicamente à música.
Foi um momento de êxtase, de pura magia. A tocata era executada com
extremo entusiasmo, tal como deve ser, e eu instintivamente, através da lente
da própria câmera, comecei a procurar pelo local onde estaria o aparelho
musical instalado, pois desejava ver o organista que tocava com tamanho
virtuosismo. Logo encontrei o lugar, na nave esquerda. Ao contornar uma meia
parede de madeira, deparei com uma freira dedilhando o órgão. Ela era uma
japonesa idosa e pequenina. Seus dedos que produziam a prodigiosa música
pareciam ter vida própria sobre as teclas. Seus sapatinhos de salto alto não eram
obstáculo para que os pés pressionassem com segurança os pedais. O som envolvia
o templo inteiro e parecia levar os ouvintes a um estado hipnótico de
encantamento.
Naquele tempo
filmava-se em fitas de VHS. Ao retornar ao Brasil descobri, desapontado, que
minha câmera apresentara um defeito e as imagens resultaram em preto-e-branco.
O som, porém, restou perfeito, e a tocata de Bach, nos dedos ágeis da idosa
organista, manteve o clima de magia do meu filme, que pode ser visto neste
resumo de dois minutos que coloquei no YouTube:
São Roberto Belarmino
Além disso,
pude ver outra das atrações da igreja, que é o corpo preservado do cardeal São
Roberto Belarmino (1542-1621) dentro de uma urna de cristal, usando suas roupas
eclesiásticas vermelhas, com o rosto protegido por uma máscara de ouro. Esse é
um dos chamados “corpos impolutos” de santos da Igreja Católica, que não
entraram em estado de decomposição e são expostos aos fiéis nas igrejas que os
cultuam.
FOTO 2 - O corpo impoluto de São Roberto Belarmino num altar
lateral.
Este,
entretanto, é um santo que me parece polêmico. Se foi canonizado, é porque
reconheceram nele as características inerentes aos santos, porém ele foi
inquisidor (participou ativamente da tenebrosa Santa Inquisição) e foi um dos
juízes de Giordano Bruno, que concordou com a decisão de queimá-lo vivo numa
estaca como herege. Que santidade perrengue!
Ademais, por
ordem do Papa Paulo V, foi o referido santo quem convocou Galileu Galilei para
ordenar-lhe negar a doutrina de Copérnico de que a Terra se movia e o Sol era
imóvel, e foi quem afirmou que se Galileu insistisse em afirmar que a Terra se
movia ao redor do Sol, ele seria preso. Acrescentou São Roberto Berlarmino ao
astrônomo: “O Sol está no céu e gira à volta da Terra em grande velocidade, e a
Terra está muito distante do céu, e está imóvel no centro do mundo”.
Por essas e
outras, é no mínimo curioso olhar para o corpo preservado desse santo, através
da parede de cristal da sua suntuosa urna funerária...
Dois anos depois, de volta a Roma
Passados dois
anos retornei a Roma e fui novamente visitar a Igreja de São Inácio de Loyola.
Desta feita não havia andaimes ou tapumes em seu interior. Entrei olhando
fascinado para a abóbada e vi o esplendor do afresco ilusionista de Andrea
Pozzo, um trompe-l’oeil que é uma das
obras-primas da história da pintura.
FOTO 3 – A pintura de Pozzo na abóbada da igreja.
FOTO 4 – Detalhe do teto ilusionista de Andrea Pozzo.
FOTO 5 – Detalhe do teto ilusionista de Andrea Pozzo.
FOTO 6 – A falsa cúpula pintada por Pozzo: trata-se de um trompe-l’oeil.
FOTO 7 - A abside (altar-mor).
De fato, não
se distingue com facilidade a ilusão da realidade e compreende-se
instantaneamente o porquê de aquelas pinturas de Andrea Pozzo serem tão
cultuadas. É preciso sentar-se para que os olhos perscrutem durante muito tempo
os detalhes da impressionante obra pictórica.
O incrível túmulo do Papa Gregório XV
As capelas
laterais da igreja também são de estonteante beleza. Por exemplo, à direita do
altar-mor encontra-se aquela que abriga o túmulo do Papa Gregório XV
(1554-1623), guardada por anjos de mármore que tocam trombetas, tendo a figura
também de mármore do papa ao centro, e o pano de fundo é uma cortina de mármore
colorido com as dobras idênticas às de um tecido verdadeiro.
FOTO 8 – Túmulo do Papa Gregório XV
Esse túmulo é
impactante. Foi mandado construir por um sobrinho de Gregório XV, chamado
Ludovico Ludovici (1595-1632), que fez jus aos favores recebidos do tio. Apenas
três dias após eleito, o Papa Gregório XV elevou Ludovico a cardeal, embora
este tivesse apenas 25 anos. Esse cardeal-sobrinho foi o detentor de uma autoridade e rendimentos sem
precedentes na história da Igreja. Foi camerlengo e vice-chanceler da
Igreja desde 1621. Pelo menos teve o mérito de ter sido um mecenas da arte e da
literatura, mas não se esqueceu de imortalizar a si mesmo na construção do
túmulo do tio-papa, pois mandou colocar na base do monumento a sua própria
efígie, o que pode ser visto no filme de dois minutos que fiz no interior da
igreja:
Não são
somente as belezas aqui comentadas que existem dentro da Igreja de Santo Inácio
de Loyola. Elas se desdobram a cada capela, a cada detalhe. É riqueza que sói
existir nas igrejas do cristianismo romano, todas elas com profundos
significados dentro da própria História da Humanidade.
-o-
Muito interessante! Parabéns pelas fotos, texto muito bem escrito!Sou sua fã incondicional! Dione Mara Souto da Rosa
ResponderExcluirQuerida Mara, fico muito contente por você ter lido e gostado. Nós empatamos, porque também sou seu fã na mesma intensidade. Obrigado. Grande beijo.
ExcluirAdorei!
ResponderExcluirOi, Ricardo. Que bom que você gostou. Obrigado.
ExcluirUm abraço.