O novo coronavírus, com aspecto de uma coroa.
Comendador Francisco Souto Neto
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APRISIONADOS NA
TORRE DE VIDRO
Francisco Souto Neto
Comecei a escrever
este texto hoje, dia 8 de agosto de 2020. Como tenho me sentido em slow motion – em câmera lenta – não sei
quando o concluirei. Entretanto quero efetuar o registro de que ontem, uma
sexta-feira deste momento em que estou próximo ao meu 5º mês de “isolamento
social” por causa da pandemia que assola o mundo, precisei sair de casa. Tive
que ir ao consultório de meu médico que fica não muito longe de onde resido,
aproximadamente a uns 800 metros de distância.
Como referido
consultório localiza-se numa rua para pedestres, onde não entram automóveis, resolvi
ir a pé. Poderia ir de carro até a um estacionamento próximo, mas enquanto
durar a pandemia espero não estacionar onde manobristas precisem entrar no meu
automóvel. Também não tomo táxis por temor à covid-19, mesmo considerando que
saio de casa somente usando luvas e máscara.
Minhas saídas
ocasionais são apenas para ir à farmácia ou ao mercado para comprar o estritamente
necessário. Além disso, tenho o privilégio de residir num ponto em que tudo é
muito próximo, num raio de cerca de 100 a 200 metros de distância: teatros,
cinemas, shopping centers, restaurantes, lojas (estes todos onde evito entrar
pelo temor ao contágio), bancos, farmácias, supermercados... e até um hospital.
As refeições são trazidas à minha porta.
O
centro de Curitiba no auge da pandemia
Ontem, ao sair de
casa, tomei o caminho do consultório, atravessando a Praça Osório e alguns
quarteirões da XV de Novembro, rua de pedestres. Senti-me impactado pelo enorme
número de pessoas transitando por ali, muitas sem usar máscara, como se não
estivéssemos num dos momentos mais dramáticos da História mundial e do Brasil.
Jovens e outros da meia idade, e alguns idosos desmascarados,
estão num ir e vir com a maior naturalidade e aparente despreocupação, gente
agrupada, alheia ao momento alarmante que vivemos imersos nas possibilidades de
contágio pela covid-19. Já são acima de três milhões de infectados e mais de cem
mil mortos no país, e os índices negativos continuam numa ascensão quase vertical.
Voltando do
consultório, prestei mais atenção ao movimento dos transeuntes na Rua XV de
Novembro. Muito impressionante o desprezo de tanta gente pela própria saúde e
pela de outrem. Isso é o reflexo do que pessoas irresponsáveis, ignorantes e
politicamente fanatizadas vêem nas reações do presidente da República face à
pandemia. Desde o começo das infecções pelo novo coronavírus, o máximo
mandatário do país disse que isso não se passava de uma “gripezinha” e
manifestou-se, todo o tempo e insistentemente, contrário ao uso de máscaras e
ao isolamento social, embora este seja, sabidamente, o único remédio contra o
mal que assola o planeta. Em julho a Agência Câmara de Notícias e diversos
jornais noticiaram o absurdo: Bolsonaro desobrigava o uso de máscaras no comércio,
na indústria, em escolas, em igrejas e em templos religiosos, bem como em
demais locais fechados em que haja reunião de pessoas. Até em presídios o
presidente desobrigou o uso de máscaras.
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Hoje é dia 23. Já nos aproximamos
do fim de agosto. Não me animei a prosseguir neste texto. Sinto-me desalentado,
inerme, quase sem o meu tônus vital, quase apático, ante os infindáveis
desmandos do presidente Bolsonaro, de muitos dos seus ministros e de políticos,
desde o começo deste (des)governo. No tocante à pandemia provocada pela
covid-19, embora eu não costume transcrever palavras de outros jornalistas, vou
tomar a liberdade de fazê-lo agora, com um texto do conhecido e respeitado
jornalista Leonardo Sakamoto, colunista do UOL, publicado no dia 19 último. Diz
Sakamoto:
”Jair Bolsonaro
afirmou que a eficácia da máscara na prevenção ao coronavírus é ‘quase nula’ a
um grupo de fãs, na porta do Palácio do Alvorada, nesta quarta (19).
O presidente
respondia a uma seguidora que disse que só tiraria fotos com ele quando não
precisasse mais usar o equipamento. Depois, ainda repetiu para quem tivesse
ficado com dúvida: ‘eficácia quase nula’. Incentiva, dessa forma, que os
brasileiros não se protejam no dia em que ultrapassamos o registro de 111 mil
mortos pela covid.
Não surpreende que
Bolsonaro minta sobre a importância fundamental do uso de máscaras para
prevenir a infecção pela doença - qualquer pedaço de tecido barato com
elásticos tem um papel mais relevante que o dele para salvar brasileiros. Mas
isso é uma demonstração irônica de falta de empatia, pois a maioria das pessoas
não têm babás como ele e veem nas máscaras uma das únicas formas que contam
para se proteger. Pois são baratas de se fazer e acessíveis. Avança, dessa
forma, sobre a única forma que famílias pobres que estão sendo obrigadas a sair
de casa para trabalhar têm de tentar alguma proteção contra a doença. Nula é,
portanto, a efetividade de suas ações. Mas se analisarmos o... - Veja mais em
https://noticias.uol.com.br/colunas/leonardo-sakamoto/2020/08/19/nulo-contra-a-covid-bolsonaro-diz-que-mascara-tem-eficacia-quase-nula.htm?cmpid=copiaecola”.
O Brasil já tem os números estarrecedores de 114.744
óbitos pela covid 19, e 3.582.362 infectados. Enquanto pessoas continuarem
seguindo as instruções do seu mito de papel, mais demoraremos para nos
livrarmos do mal que tanto aflige a nós e a todo o planeta.
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Francisco Souto Neto em agosto de 2020, aos 77 anos, em quarentena há cinco meses, olhando para o futuro.
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Querido Padrinho. O seu texto traduz a sensação de muitos brasileiros que discordam as atuais políticas de pouco caso com os cidadãos e cidadãs brasileiras. Nisso, inclui-se a minha. Uma apatia e desânimo tomam conta das pessoas. É esperar que tudo passe, e logo.
ResponderExcluirQuerida Mara, obrigado por opinar. Sim, é a expectativa de todos.
ExcluirDesejo que em 2021 já estejamos livres desse mal, embora me faça parecer que isso só se dará em 2022. Espero estar enganado. O tempo responderá.