Diligência que em 1862 fazia o transporte de viajantes entre o Rio de Janeiro e Paraibuna (Juiz de Fora)
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Comendador Francisco
Souto Neto
O visconde de Souto financiou
a Estrada União e Indústria,
a primeira rodovia pavimentada no Brasil
a primeira rodovia pavimentada no Brasil
Francisco Souto Neto
A
biografia do visconde de Souto que será realizada pela Editora Prismas
encontra-se em fase de diagramação. O título do livro é Visconde de Souto – Ascensão e
Quebra no Rio de Janeiro Imperial. Nessa
obra, eu e minha coautora Lúcia Helena Souto Martini revelamos alguns fatos
pouco conhecidos do Brasil Imperial que envolveram o biografado, nosso trisavô.
Um dos capítulos da biografia diz respeito à história da primeira estrada macadamizada do Brasil, inaugurada em 1861, que foi financiada pelo visconde de Souto. Ao ser construída, tornou-se a maior obra de engenharia de toda a América Latina.
Com Vanderlei da Cruz, editor-chefe da Prismas, que segura o "print" (exemplar-protótipo) da biografia do visconde de Souto.
Lombada do "print".
O livro aberto no capítulo sobre a Estrada União e Indústria.
Um dos capítulos da biografia diz respeito à história da primeira estrada macadamizada do Brasil, inaugurada em 1861, que foi financiada pelo visconde de Souto. Ao ser construída, tornou-se a maior obra de engenharia de toda a América Latina.
A
esse tempo, o banqueiro António José Alves Souto era conhecido como “comendador Souto”. O título “visconde de Souto” lhe seria outorgado no ano seguinte, 1862, pelo
rei de Portugal dom Luís I.
O
relato da inauguração da Estrada União e Indústria consiste do Capítulo 27 da biografia
acima referida. Hoje vou transcrever este pequeno trecho a meus leitores, com o
propósito de dar-lhes uma ideia do que virá a ser o nosso livro, que deverá ter
seu lançamento nacional na segunda quinzena de setembro vindouro, no Palacete dos Leões, Curitiba.
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CAPÍTULO 27
A ESTRADA
UNIÃO E INDÚSTRIA
por
por
Francisco Souto Neto e Lúcia Helena Souto
Martini
Francisco Souto Neto Lúcia Helena Souto Martini
-o-
Francisco Souto Neto Lúcia Helena Souto Martini
-o-
A
primeira estrada pavimentada da América do Sul ligava Petrópolis,
no Rio de Janeiro, a Paraibuna, antigo nome de Juiz de Fora, em Minas Gerais. Com
144 quilômetros
de extensão, foi inaugurada em 23 de julho de 1861; era macadamizada, isto
é, tinha o leito composto por pedregulhos, areia e
cimento, recebendo na superfície uma camada impermeabilizante.
Destinava-se a carroças de quatro rodas, carruagens e diligências, e a receita
provinha da cobrança de pedágio por mercadoria, mais precisamente por burro
carregado. Sua construção constitui uma das mais interessantes páginas do
Brasil imperial. Financiada por António José Alves Souto, futuro visconde de
Souto, a seu tempo foi a maior obra de engenharia de toda a América Latina,
tendo recebido o nome de Estrada União e Indústria. Essa rodovia contava com
“estações” nas cidades principais e também vários postos para a substituição
dos animais de tração cansados, avanços admiráveis para aquela metade do século
XIX.
António José Alves Souto, o visconde de Souto (Acervo Beneficência Portuguesa, Rio de Janeiro).
No dia 7 de agosto de 1852, Mariano
Procópio Ferreira Lage obteve autorização para a sua construção, com base no
decreto imperial de n.º 1301. O empreendimento era, em princípio, considerado
impossível de ser realizado, pois seu traçado deveria vencer inúmeros cursos
d’água e altas escarpas de granito da serra do Taquaril. Mariano Procópio
contratou o arquiteto brasileiro Antônio Maria Bulhões para realizar o trecho
de Petrópolis a Três Rios, e o alemão Keller para o trecho de Três Rios a
Paraibuna.
Homens no penoso trabalho de macadamizar.
O escritor Nelson Werneck Sodré, na
segunda edição da obra História da
burguesia brasileira, faz saber que a Estrada União e Indústria “foi
financiada pelo banqueiro Souto” (SODRÉ, 1957, p. 123). O mesmo é afirmado por
Almir Chaiban El-Kareh, no livro Filha
branca de mãe preta: a Companhia da Estrada de Ferro D. Pedro II. Também a
Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro de 1956 assinala: “O
Comendador António José Alves Souto, que, compreendendo o alcance da grande
empresa tentada pela Companhia União e Indústria, confiou-lhe avultados
capitais”. (REVISTA IHGB, 1956, p. 175).
Efetivamente, enquanto Mauá financiava a
construção de estradas de ferro, o Souto começava a financiar estradas de
rodagem.
"D. Pedro II saiu desta casa para inaugurar a Estrada
União e Indústria, 23 de Junho de 1861", registra a placa nos jardins do
Museu Imperial de Petrópolis.
Omer Mont’Alegre, em Capital & capitalismo no Brasil,
relata como foi organizado o cortejo de Petrópolis a Paraibuna, mencionando que
a inauguração da rodovia ocorreu num mês de junho, enquanto outros autores
citam julho:
“Na inauguração, para o percurso de
Petrópolis a Juiz de Fora, em 23 de junho de 1861, foi empregado um cortejo de
cinco diligências, puxadas por quatro mulas em quatro parelhas, cada uma com
capacidade para quatorze passageiros, além do cocheiro e condutor. [...] Era a
primeira rodovia brasileira. A companhia construtora teve que enfrentar sérios
problemas, face ao elevado custo, recorrendo ao crédito no Rio de Janeiro, da
casa A. J. A. Souto & Cia. e em Londres. (MONT’ALEGRE, 1972, p. 130)”.
Diligências ou carruagens da Estrada União e Indústria (Museu
Mariano Procópio).
Dom Pedro II, a imperatriz e as duas
princesas viajaram na carruagem imperial. Diversos convidados da corte fizeram
o percurso em suas conduções particulares. Também o visconde de Souto preferiu
ser levado por sua própria carruagem puxada por quatro cavalos, mas a partir de
Petrópolis seguiu junto à comitiva imperial.
Num aprofundado estudo de sociologia e
antropologia, a historiadora Patrícia Falco Genovez escreveu A viagem enquanto forma de poder: a viagem
de Pedro II e a inauguração da Rodovia União e Indústria, em 1861,
publicada em Tempo, da UFF, onde, em
meio a outras análises, relata vivamente o dia da inauguração com a presença de
dom Pedro II em
Paraibuna. No intróito ao seu trabalho, a autora transcreve o
texto “Viagem de Petrópolis a Juiz de Fora por ocasião de inaugurar-se a
Estrada União e Indústria, Juiz de Fora, Tipografia Sul, 1919, páginas 27, 29 e
30”:
O visconde de Souto (acervo Museu Histórico Nacional)
“A multidão ocupava todos os arredores.
A comitiva imperial, atravessando por entre as alas assim formadas, chegou à
quinta do Sr. comendador Mariano Procópio Ferreira Lage, destinada para
residência de Suas Majestades e Altezas. À porta da casa foram as augustas
pessoas recebidas com estrondosas aclamações, ao som do hino nacional tocado
pela excelente banda de música da colônia, e por grande número de cidadãos.
[...] Suas Majestades e Altezas recolheram-se para descansar, e as pessoas de
sua comitiva, assim como os convidados recém-chegados, procuraram orientar-se a
fim de acertarem quanto antes com os aposentos que lhes estavam destinados. O
paço imperial achava-se disposto e mobiliado com extremo bom gosto e elegância,
como tudo quanto foi feito pelo Sr. Comendador Ferreira Lage. [...] O que
sobretudo não se pode referir com precisão foi o transporte de que todos se
possuíram, quando, dando apenas alguns instantes às necessidades do toilette, acharam-se na presença da
mais esplêndida iluminação.Tudo quanto a vista alcançava na extensa área que
tentamos descrever, oficinas, armazéns, serraria, olaria, moinho, toda sorte de
numerosos edifícios, telhados, muros, paço imperial, arcos, jardim, cerca,
pontes, arbustos, lagos, ilhas, coreto, gruta, colina, castelo, tudo enfim
cintilava ao clarão de cinco mil luzes, lampiões chineses e copos, delineando
os contornos dos objetos iluminados; e tudo isto fora aceso como por milagre,
em um abrir e fechar d’olhos; tão bem dispostas estavam todas as coisas! E como
se não bastasse o que víamos, grandes fogueiras coroando as alturas
circunvizinhas, o céu recamado de estrelas, uma noite tão serena que as folhas
das árvores não se moviam, nem uma luz se apagava, os ecos repetindo as lindas
peças de música tocadas pela excelente banda da colônia e composta de
instrumentistas que dez meses antes não conheciam as sete notas, eram outros
tantos motivos de gozo. O toque das trombetas percorrendo a estação, e
anunciando que o jantar nos esperava, arrancou-nos a custo da contemplação do
maravilhoso quadro que tínhamos diante dos olhos. (GENOVEZ; UFF et al., 1996, p. 161)”.
Em seguida, Patrícia Falco Genovez
apresenta sua visão sobre a importância da estrada que, entretanto, desviou o
centro da cidade de Paraibuna, privando-a de uma estação, que foi construída
fora do perímetro urbano, próxima às terras de Mariano Procópio, para o
desgosto dos políticos locais e da população.
A estação de Paraibuna e diligências que ligavam a cidade
acima, hoje Juiz de Fora, com a corte imperial (Rio de Janeiro).
“Inaugurada no ano de 1861, a rodovia União e
Indústria pode ser interpretada como uma 'ponte' que unia os interesses do Império aos da região sul da
Zona da Mata Mineira e, particularmente, de Juiz de Fora. ‘Ponte’ não pelo aspecto econômico,
mas sim pelo simbolismo de que se viu revestida. Na realidade, a primeira
estrada macadamizada do país não foi capaz de propiciar o desenvolvimento
industrial da cidade, pelo menos não o que se esperava, e comprometido o seu funcionamento
pelo constante déficit da companhia, acabou superada em importância econômica
pelos caminhos de ferro. Por outro lado, porém, a presença do imperador à
inauguração e o discurso de progresso que a caracterizou, só a fizeram crescer
na imaginação dos contemporâneos e até da historiografia posterior [...].
(GENOVEZ; UFF et al., 1996., p. 162)”.
Efetivamente, como se lê também em Filha branca de mãe preta, a construção
da Estrada de Ferro Dom Pedro II, numa bifurcação não prevista, avançou na direção
de Juiz de Fora:
“Incidente mais grave foi o ocorrido
entre a Companhia da Estrada de Ferro Pedro II e os grupos de interesse ligados
à Companhia da Estrada União e Indústria. Quando a linha chegasse a Barra do
Piraí, os planos [...] à passagem do Paraibuna já deveriam estar aprovados,
para dar continuidade ininterrupta aos trabalhos da linha. Foi aí que
intervieram aqueles grupos reunidos em torno da União e Indústria. [...]
(EL-KAREH, 1982, p. 119)”.
O comendador Alves Souto (futuro visconde de Souto) usando
sua comenda da Ordem da Rosa.
O barão de Mauá (futuro visconde de Mauá) usando a sua
comenda da Ordem da Rosa, tal como o visconde de Souto na foto anterior.
Tais grupos eram representados pelo
presidente da União e Indústria, Mariano Procópio Ferreira Lage; o barão de
Mauá, cuja ferrovia particular, na Raiz da Serra de Petrópolis, recebia
principalmente o café que vinha até ali pela Estrada União e Indústria; o
banqueiro António José Alves Souto, financiador da estrada macadamizada, da
qual era credor; e a diretoria da Estrada de Ferro da Cantareira, que se sentiu
também prejudicada pela Estrada de Ferro Dom Pedro II.
Prossegue a historiadora Falco Genovez
sobre a matéria, objeto também do livro Tempo,
publicado em 1996 pelo Departamento de História da Universidade Federal
Fluminense:
“A inauguração da rodovia União e
Indústria, portanto, que se deu em 1861 e contou com a presença de Pedro II, na
cidade de Juiz de Fora, por cinco dias, pode ser encarada como parte do projeto
de unidade nacional. Um projeto que não se encontrava acabado naquela década.
Bastante rica no tocante à sua descrição, a viagem de inauguração tornou bem
evidente o perfil de uma elite que estabeleceu, nitidamente, as posições sociais
de cada um de seus atores no palco da monocultura cafeeira e escravocrata do
Império. (GENOVEZ; UFF et al., 1996,
p. 163)”.
Aspecto da Estrada União e Indústria, macadamizada, em 1861.
Mais adiante, a historiadora descreve
como transcorreu o jantar comemorativo à inauguração da Estrada União e
Indústria, no qual o comendador Alves Souto foi homenageado com um dos seis
brindes levantados por algumas das personalidades presentes. O suntuoso
palacete de Mariano Procópio, um castelo em estilo renascentista italiano,
elegantíssimo, tinha aspecto arrebatador. Localizava-se nos arredores de
Paraibuna, a três quilômetros do centro urbano. Ali, onde a família imperial se
hospedava, foi servido o jantar:
A quinta do comendador Mariano Procópio Ferreira Lage em Paraibuna (Juiz de Fora em 1861).
Visconde de Souto.
Mariano Procópio
D. Pedro II.
“Outro símbolo de distinção pode ser
observado no jantar, quando os convidados foram chamados para o banquete,
servido numa mesa de cem talheres, revezando-se por três vezes. Vários brindes
foram feitos: a Mariano, pelo Sr. Bernardo Joaquim de Oliveira; ao Sr. diretor
Dr. José Machado Coelho de Castro, pelo comendador Mariano; ao comendador
Antônio J. A. Souto, pelo conselheiro Dr. Francisco de Paula Cândido; ao corpo
legislativo e ao governo do país, pelo Dr. José Machado Coelho de Castro; aos engenheiros
e empregados da companhia, pelo comendador Joaquim A. F. Pinheiro; à família
imperial, pelo comendador Mariano. Os relatos da época não nos informam quem,
além dos nomes citados nos brindes, estavam presentes à mesa na primeira vez
que o banquete foi servido, mas é de se imaginar a concorrida ‘dança das
cadeiras’ que se deve ter estabelecido. (GENOVEZ; UFF et al., 1996, p. 173)”.
Das extensas considerações de Patrícia
Falco Genovez a respeito do imperador, destaca-se o seu parágrafo final:
“Pedro II também pode ser compreendido
como uma figura política que via aproximar-se, com rapidez, a modernidade que
poria fim à escravidão. Um viajante lúcido que compreendeu as tramas de poderes
que se formavam em seu império. Sua presença marcava a monocultura, a
escravidão e o poderio de barões latifundiários. Mas Pedro II sabia que a
transição era inevitável e, também, mostrava sua face de modernidade ao
financiar e incentivar um empreendimento como o do comendador Mariano. Enfim,
este período tão específico da história do Brasil e da América do Sul, cuja
riqueza de símbolos e ritos oferece uma constelação de nobres, títulos, ritos,
cerimoniais, luxo e ostentação, apresenta uma malha delicada e perigosa de
poderes que o historiador pode e deve observar mais de perto através da luneta
da pompa. (GENOVEZ; UFF et al., 1996,
p. 180)”.
Detalhes dos serviços oferecidos pela
inovadora estrada, no que diz respeito às diligências destinadas ao transporte
coletivo de passageiros, encontram-se em O
ouro, o café e o Rio, livro de Brasil Gerson:
Diligência que em 1862 fazia o transporte de viajantes entre o Rio de Janeiro e Paraibuna (Juiz de Fora)
“E as diligências, as seges construídas
em Juiz de Fora dariam realmente o que falar. Grandes, confortáveis e
elegantes, as diligências com lugar para 6 pessoas na berlinda e 10 em cima,
sendo 14 passageiros e o cocheiro e o condutor, e espaço ainda para malas, todo
esse peso puxado por 4 valentes mulos, a 16 quilômetros por
hora. Os cocheiros e condutores vestiam sobrecasaca de pano azul com botões
amarelos, e boné do mesmo pano com galão de ouro, numa descrição de um cronista
de então. E ainda com assistência no caminho, nas 12 ‘mudas’ estabelecidas para
a troca dos mulos, e uma estação imponente como a de Juiz de Fora que custara
780 contos, mais do dobro da do Campo de Santana, da Estrada de Ferro D. Pedro
II. (GERSON, 1970, p. 68)”.
FOTO
– Cristiano Benedito Otoni.
As análises das divergências entre a
Estrada União e Indústria e a Estrada de Ferro Dom Pedro II não podem deixar de
evocar a figura polêmica de Cristiano Benedito Otoni (1811-1896), irmão de
Teófilo Otoni, que foi capitão-tenente da Marinha, engenheiro, professor de
Matemática, senador do império e, depois, investido do mandato de senador da
república. É considerado o “pai das
estradas de ferro no Brasil” por ter sido o primeiro diretor da Estrada
de Ferro Dom Pedro II e o homem que fez os trilhos subirem a Serra do Mar em
direção a Minas Gerais e a São Paulo, entre 1855 e 1865. Escreveu diversos
livros, dentre os quais Autobiografia.
Para que se tenha uma idéia do espírito provocativo do autor, vale transcrever
o primeiro parágrafo do primeiro capítulo do referido livro, que se intitula Por que e para que escrevo:
“Não é porque eu creia que estas
memórias serão de grandes utilidades. Nem que se destine à Imprensa ou à
posteridade, que (estou certo) não se ocupará com a minha pessoa. A ninguém
pretendo mostrar este livro: aí ficará. Quando eu morrer, faça dele a minha
família o que bem lhe parecer: leia-o ou não; mostre-o a quem quiser ou
esconda-o; imprima-o ou queime-o, como for de seu agrado. (OTONI, 1983, p. 3)”.
Tal Autobiografia
é uma peça literária de grande valor histórico. No longo capítulo em que narra
o que significou dirigir a Estrada de Ferro Dom Pedro II, até à sua exoneração
por motivos políticos, conclui por fazer uma denúncia, envolvendo os maiores
políticos de então:
“Contraste curioso! O mesmo Ministro que
me exaustorou e quase enxotou-me, assinou um aviso louvando os meus ‘grandes
serviços’; e o mesmo ministério presidido pelo grande ator Marquês de Olinda,
fez-me por Decreto, Dignitário da Ordem do Cruzeiro!!!. [...] Odiento e
hipócrita Marquês de Olinda. (OTONI, 1983, p. 115 e 118)”.
A respeito da linha férrea que por
deliberação ministerial deveria originalmente ser construída de Barra do Piraí
até Entre Rios, na província do Rio de Janeiro, denuncia Cristiano Benedito
Otoni:
“Esta linha, previa-se, faria
concorrência ruinosa à Estrada União e Indústria, à Estrada de Ferro de Mauá, e
daria prejuízo à de Cantagalo: pelo que, unidas as três empresas ao então
poderoso Banqueiro Souto, credor da primeira por cerca de 2.000:000$000
pleiteavam a supressão da 3ª seção: para eles, a Estrada de Ferro D. Pedro II
não deveria dar um passo além da Barra do Piraí. Além do empenho dos quatro potentados
– Souto, Ferreira Lage, barão de Mauá e visconde de Barbacena – recomendavam a
medida certos temores financeiros: julgavam alguns, e entre eles o ilustrado
visconde de Itaboraí, que a empresa era grandiosa demais para os nossos
recursos. Ou porque entrasse sinceramente nessas vias acanhadas, ou também
porque quisesse pregar-me peça, Manoel Felizardo de Souza e Melo, anuiu aos
desejos dos quatro, resolveu a mutilação pedida, e chegou a anunciar-me
verbalmente a deliberação: não deveria eu lançar um trilho mais além da Barra
do Piraí. (OTONI, 1983, p. 98)”.
No entanto, numa mudança da política, a
Estrada de Ferro Dom Pedro II foi autorizada a avançar até Entre Rios, e além.
Num gesto de aparente represália, construiu sua estação ao lado da Estrada
União e Indústria, tornando-a um simples seu afluente e levando a Estrada de
Ferro da Mauá à bancarrota, assim liquidando esta parceria entre Souto e Mauá.
O já mencionado livro História da burguesia brasileira oferece
em números a decadência da Estrada União e Indústria, que em 1861 dera uma
receita de 219 contos, declinou para 143 em 1862 e para 82 em 1863. Quando foi
encampada em 1864 – ano da falência do visconde de Souto – seus compromissos
elevavam-se a cinco mil contos de réis:
“A encampação ficou em 9.161 contos, dos
quais 6.000 seriam destinados aos credores ingleses e 2.000 à massa falida do
banqueiro Souto, que financiara a construção. As esperanças de Mauá
malograram-se: a Estrada de Ferro D. Pedro II transporia a serra por simples
aderência: chegara a Belém [Rio de Janeiro] em 1858, e a Barra do Piraí em
1863, carreando o café e liquidando a ferrovia de Mauá, que ficara na
dependência da Rodovia União e Indústria. A Serra de Petrópolis foi transposta
depois, em 1883, pela Estrada de Ferro Grão-Pará, que incorporou o trecho de
Mauá na Baixada, acabando, por sua vez, absorvida pela Leopoldina Railway,
pertencente aos ingleses. (SODRÉ, 1964, p. 139)”.
Mauá, apelidado de “o rei do Brasil”,
viria a falir em 1875.
A Rodovia União e Indústria continua a
existir em muitos trechos, ainda com o mesmo nome. No atual Estado do Rio de
Janeiro, identificada também como RJ-134, ela vai de Petrópolis a Areal,
algumas vezes bem paralela ao traçado da moderna Rodovia Washington Luiz, que
liga a cidade do Rio de Janeiro a Belo Horizonte. Em Minas Gerais , próxima
a Juiz de Fora, a Rodovia União e Indústria, que lá é também chamada de BR-267,
serve como uma variante da BR-040,
a Rodovia Washington Luiz.
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